Quase 230.000 crianças, mulheres grávidas e mães recentes podem morrer de fome, nos próximos meses, no Sudão, se não existir ajuda urgente, alertou, hoje, a Organização Não-Governamental (ONG) Save the Children.
Em comunicado, a ONG, afirma que esta calamidade só poderá ser evitada se forem libertados “fundos urgentes e que salvem vidas para responder à crise maciça e agravada no Sudão”.
“Estamos a assistir a uma fome maciça, ao sofrimento e à morte. E, no entanto, o mundo desvia o olhar. A comunidade internacional tem de se unir para atuar e evitar que se percam mais vidas. A história recordará esta inação”, refere Arif Noor, Diretor Nacional da Save the Children, no Sudão.
Mais de 2,9 milhões de crianças no Sudão sofrem de desnutrição aguda e mais 729.000 crianças, com menos de 5 anos, sofrem de desnutrição aguda grave - de acordo com os novos números divulgados pelo Grupo de Nutrição no Sudão, uma parceria de organizações como a ONU, o Ministério Federal da Saúde e ONG, incluindo a Save the Children.
Destas crianças, mais de 109.000 são suscetíveis de ter complicações médicas como desidratação, hipotermia e hipoglicemia.
De acordo com o ‘cluster’, cerca de 222.000 crianças gravemente subnutridas e mais de 7.000 novas mães poderão morrer nos próximos meses se as suas necessidades nutricionais e de saúde não forem satisfeitas.
Segundo Arif Noor,”a situação nutricional no Sudão é uma das piores do mundo. Não ter plantado no ano passado significa não ter comida hoje. Não plantar hoje significa não ter comida amanhã. O ciclo da fome está a piorar cada vez mais, sem fim à vista - apenas mais miséria”.
De notar que, de acordo com a Save the Children, o nível de financiamento atual é inferior ao do ano passado. “Os atuais níveis de financiamento do programa de alimentação de emergência no Sudão, neste momento cobre apenas 5,5% das necessidades totais do país. Em contrapartida, no ano passado, o programa de alimentação de emergência foi financiado em 23% - ainda uma fração do financiamento necessário, mas substancialmente mais do que agora”, lê-se no comunicado.
Um outro fator crítico é o agravar dos combates no Sudão. “Em dezembro, o estado de Al-Jazirah, outrora o celeiro do país, foi palco de intensos combates que conduziram a uma nova vaga de deslocações, com mais de meio milhão de pessoas a fugir das suas casas em busca de segurança. Esta situação conduziu a uma perturbação sem precedentes dos sistemas alimentares”, refere o diretor da Save the Children no país.
Para se ter uma ideia da situação, em apenas um mês, o número de áreas consideradas “de difícil acesso” pelo Grupo de Nutrição nacional, aumentou 71%, de 47 em novembro de 2023 para 135 no final de dezembro, devido ao aumento dos combates.
Desde a escalada do conflito em abril de 2023, a produção alimentar caiu, as importações estagnaram e os preços dos alimentos básicos subiram 45% em menos de um ano. A circulação de alimentos em todo o país, em especial nas zonas rurais e remotas onde vive a maioria da população, também foi severamente restringida devido ao conflito, levando mais de 37% da população a passar fome acima dos níveis de crise.
O Sudão tem lutado com as devastadoras consequências políticas, de segurança e humanitárias dos combates que eclodiram em 15 de abril em Cartum e arredores, na sequência de divergências entre o exército e as Forças de Apoio Rápido (RSF) sobre a integração deste grupo paramilitar nas forças armadas, o que fez descarrilar o processo de transição que se seguiu ao derrube do antigo Presidente, Omar Hassan al-Bashir, após 30 anos no poder.
Atualmente, os confrontos levaram a uma guerra civil que causou um número recorde de pessoas deslocadas: nove milhões internamente e 1,7 milhões de exilados, o maior número do mundo neste momento, ultrapassando mesmo os sete milhões de sírios deslocados.