O mês que agora termina fica indubitavelmente marcado pelos debates televisivos em catadupa, embora a música não tenha fugido muito ao que era esperado: habitação, emigração (conceito a rever, num espaço europeu que se quer comum!), salários, entre outros. Nada de novo, diria! Mas o lado B não pode ser ignorado, ao contrário do que fazíamos com os velhos singles de vinil. Também é necessário refletir sobre tudo aquilo que ficou por dizer. E, infelizmente, notou-se um vazio grande em certas matérias, embora haja ainda muito tempo para correções na partitura.
Algo que me pareceu óbvio é que o contexto internacional e o projeto europeu, em sentido lato, foram muito esquecidos. Porventura, deliberadamente ignorados. Afinal, há que reconhecer que estamos “apenas” no combate para as legislativas e que ainda temos pela frente outros desafios. De qualquer modo, considerando que a formação do futuro governo poderá não ser um processo tão pacífico e célere quanto o desejável, corremos o sério risco de chegarmos às vésperas das europeias sem grandes debates em torno da matéria. E a nível regional, pior ainda, a confirmar-se a realização de regionais lá para o fim de maio, como se perspectiva. O tempo e a atenção dispensada à Europa poderão tornar-se escassos, o que não deixa de ser preocupante, se pensarmos que estamos a falar de um ato eleitoral onde, por norma, as taxas de participação ficam aquém do desejável, quando em bom rigor, deveriam ter um enorme envolvimento dos cidadãos, atendendo à importância das mesmas para o nosso presente e futuro. Até porque a Europa não são os outros! Somos nós todos, sem qualquer exceção, independentemente da nacionalidade e muito menos ainda da distância física a que nos encontramos de Bruxelas. Aliás, não consigo entender este “disco riscado” da distância a Bruxelas. É o pior argumento que me podem apresentar para desculpabilizar o nosso modesto envolvimento para com a Europa.
Além disso, quer queiramos, quer não, há que admitir que a situação geopolítica internacional vive momentos conturbados e que o dossier Putin, infelizmente, parece estar para durar. Os recentes alertas de von der Leyen à necessidade dos Estados-membros investirem mais no domínio da defesa tem tanto de sensato, como de triste e preocupante. Mas outros dossiers merecem também um olhar atento, como o Pacto Ecológico Europeu (PEE), cujas boas intenções ninguém no seu perfeito discernimento poderá negar, mas que no campo da execução tem gerado descontentamentos que merecem a devida reflexão. Aliás, este será, sem sombra de dúvidas, um ponto de discórdia entre os futuros candidatos ao Parlamento Europeu, não pela contestação às metas definidas pelo PEE, inquestionáveis do ponto de vista do compromisso que temos de manter para com o planeta na defesa da sustentabilidade e na inquestionável necessidade de adaptação às alterações climáticas, mas sim, pela forma, e sobretudo, pelo ritmo que queremos ou não imprimir para alcançar essas metas imperiosas.
E é neste contexto que Portugal está apenas e tão-somente a perder a maior oportunidade de desenvolvimento que já teve desde a sua entrada na então CEE. Da estabilidade política proporcionada por uma maioria absoluta, passando pelo Quadro Financeiro Anual (favorável) e, sobretudo, pelo bónus extra dos muitos milhões do Plano de Recuperação e Resiliência, a verdade é que tínhamos tudo para dar “aquele salto” e colocar-nos definitivamente entre os melhores no contexto da UE a que pertencemos. A este ritmo, e com a casa ainda por arrumar, há sérios riscos de concluirmos este ciclo num ranking ainda mais modesto, comparativamente a outros Estados-membros. Nessa altura se verá, então, quem fez bem o trabalho de casa e teve a capacidade de realizar os investimentos mais inteligentes e realmente produtivos. O tempo o dirá.