Várias Organizações Não-Governamentais (ONG’s) do setor do Ambiente condenaram a proposta de abertura da Reserva Natural das Ilhas Selvagens à pesca do atum.
Num comunicado conjunto, ANP|WWF, GEOTA, LPN, Sciaena, SOA Ocean Devotion Madeira, SPEA e ZERO manifestaram “a sua profunda preocupação e desaprovação perante” tal possibilidade, que foi posta em cima da mesa, recordam, “no âmbito das negociações para sustentar um novo governo regional na Madeira”.
“A possibilidade de se permitir a pesca na maior Área Marinha Protegida (AMP) do Atlântico Norte não só comprometeria a integridade ambiental da reserva, mas também colocaria em risco anos de esforços de conservação dos habitats de inúmeras espécies marinhas”, defendem as ONG’s lembrando que a área protegida das Selvagens constitui “atualmente a maior do Atlântico Norte, também em termos de proteção total”, sendo “um refúgio essencial para a biodiversidade marinha, abrigando espécies únicas e desempenhando um papel crucial na preservação dos ecossistemas marinhos e na própria produtividade do mar da Madeira, que beneficia do efeito spillover que as reservas marinhas integrais, como a das Selvagens, fornecem”.
“Estudos científicos demonstram que áreas de proteção total, como a Reserva Natural das Ilhas Selvagens, são fundamentais para a regeneração das unidades populacionais e para a manutenção da saúde do meio” a “as Selvagens são uma zona importante para a nidificação de muitas espécies de aves marinhas, como a cagarra (Calonectris borealis), o calca-mar (Pelagodroma marina) ou o pintainho (Puffinus lherminieri), tendo estas duas últimas espécies um estatuto de ameaça na Região da Madeira”, acrescenta-se no comunicado.
“A partir de 1976, a melhoria da proteção da ilha permitiu recuperar a população de cagarras que esteve quase a desaparecer, tendo hoje as Selvagens a colónia com maior densidade de todo o mundo. Em 2022, a extensão da área protegida para mais de 27 vezes a área anterior tornou as Selvagens a maior área marinha com proteção total da Europa. São mais de 2600 km² de mar salvaguardado de atividades extrativas como a pesca ou a exploração de inertes, privilegiando a conservação de um valioso e riquíssimo património natural”, lembram.
O comunicado recorda as palavras “acertadas” do presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, feitas há dois anos, “aquando da criação da maior área marinha da Europa com proteção total”.
“Albuquerque dizia, acertadamente, que a Madeira ‘tem sido uma referência mundial em matéria de políticas de conservação da natureza’ e que esperava que a medida servisse ‘de inspiração para que outros decisores tomem medidas semelhantes, no sentido da preservação’ do oceano”, recordam, sublinhado que “considerar a abertura à pesca de uma área já protegida é perigoso, indesejado e contraria os esforços globais de proteção ambiental, essenciais para combater a crise climática e da biodiversidade”.
Para as ONG’s, a “abrir exceções para esta ou qualquer outra atividade extrativa é altamente preocupante, num momento em que é crucial demonstrar firmeza e liderança. Como país marítimo, Portugal tem a oportunidade e a responsabilidade de ser uma referência global na defesa do oceano.”
Na nota é referido ainda que “esta proposta é também incompatível com os objetivos da Agenda 2030, especialmente com a meta de proteger estritamente 10% do mar. Atualmente, Portugal protege integralmente (ou seja, sem permitir quaisquer atividades extrativas) apenas 3% das suas águas, estando muito aquém das metas estabelecidas.”
“Esta situação agravar-se-á ainda mais se houver retrocessos nos pequenos avanços alcançados, reduzindo a área que Portugal tem atualmente de proteção integral”, o que “evidencia a importância de proteger refúgios marinhos como as Selvagens, um dos poucos verdadeiramente protegidos em território nacional”.
Tendo em conta o exposto, as ONG’s “apelam assim ao Presidente do Governo Regional e ao Governo da República para que travem esta possibilidade e defendam a manutenção da proteção total da reserva como uma prioridade para garantir a sustentabilidade dos recursos pesqueiros e a preservação da biodiversidade marinha para as futuras gerações”.
A ONG’s “disponibilizam-se ainda para continuar o diálogo com o sector da pesca do atum no sentido de identificar outras medidas que possam contribuir para as condições sócio-económicas da sua atividade, sem pôr em causa a conservação do ambiente”.