Um perfeito disparate face à nossa real situação. A Região do país com o mais baixo poder de compra, com a mais baixa média salarial, é a segunda região do país onde é preciso ganhar mais para conseguir suportar a compra de uma casa. Revela bem o quão desajustado estão os índices de investimento e crédito face à realidade da população madeirense.
É que parece que temos duas regiões: A região de sonho (para alguns), dos vistos gold, dos investimentos milionários, das habitações de luxo e a Região do comum dos mortais, dos que trabalham e se esfalfam para conseguir pagar a renda ou o crédito à habitação e ainda ter comer na mesa, dos que não conseguem poupar porque o dinheiro não chega, das habitações que tem carências a vários níveis, a região da maioria dos madeirenses e portosantenses.
Há dias, um suplemento deste jornal, publicitava um empreendimento privado no Funchal com apartamentos destinados à classe média, com preços a partir dos 450.000 € para um T1, 750.000 € para um T2 e 1.200.000 € para um T3! Que classe média é esta que consegue comprar apartamentos destes valores? Porque classe média é aquela que tem os seus rendimentos e que não precisa de apoios para viver. Ou pelo menos era, até há bem pouco tempo.
A habitação é um dos problemas que os madeirenses e portosantenses mais sentem neste momento e nada está a ser feito por quem tem responsabilidades governativas para resolvê-lo. Pelo contrário, quando no país se pretende acabar com os vistos gold e limitar os alojamentos locais, aqui pretende-se que estes mecanismos continuem a nos limitar o acesso à habitação.
Ouvimos os nossos governantes do PSD preocupados com o fim dos vistos gold, mas não ouvimos dizerem absolutamente nada sobre como inverter esta preocupação da classe média. Os apoios são sempre para os mesmos, e a classe média cada vez mais deixa de o ser.
Governar bem é criar mecanismos para que os investimentos de luxo sejam permitidos e possam existir em harmonia com o resto da construção para a população residente. É cumprir a lei e saber fazer as coisas. É preciso competência e seriedade. Os grandes investimentos, sejam locais ou estrangeiros, a entrada de capital na região, são positivos quando feitos com planeamento e estratégia. Há necessidade de transformar toda a construção em habitação de luxo e empreendimentos milionários? Porque é que os nossos governantes só se preocupam com estes cidadãos estrangeiros e tão pouco com a população que os elege. É assim tão débil a nossa capacidade de atração de investidores, para precisarem deste tipo de benefícios?
O Governo Regional vai agora, graças ao PRR, investir milhões em habitação social. Mas foi preciso o Governo da República definir como prioridade máxima o problema da habitação, criar o primeiro direito e as estratégias de habitação para que o Governo regional, supostamente autonómico, soubesse ou quisesse fazer alguma coisa nesta area. 47 anos de governação do PSD e continuamos a ter a maioria das famílias pobres e com carências a vários níveis, temos um dos maiores índices de pobreza do país, uma dívida gigantesca para pagar, muita dela por opções erradas e obras inventadas, e portanto está na altura de mudar e de olhar com um cuidado especial para esses cerca de 80.000 madeirenses que vivem em situação de pobreza ou exclusão social, olhar para uma classe média que precisa de ser ajudada e que todos os dias perde poder de compra, olhar para os milhares de funcionários públicos que chegam ao fim do mês sem um único euro.
Duarte Caldeira escreve à segunda-feira, de 4 em 4 semanas