Noutros tempos, todos os palmos de terra estavam ocupados. Aproveitavam-se todos os cantinhos para plantar algo. E o que não servisse para isso, servia para dar erva para o gado. Eram tempos de fome para muitos. Quem tinha o seu “pedacinho” de terra aproveitava-o o melhor que podia. A terra tinha de alimentar muita gente. Colhiam-se as semilhas, e a terra nem descansava, já se plantava o milho. Colhia-se o trigo e logo já se preparava o terreno para batatas e feijão. Os ciclos repetiam-se, uns a seguir aos outros.
Quem não tinha terra, por vezes, plantava em terrenos cedidos pelos senhorios. Os caseiros plantavam, cuidavam e colhiam, mas metade da colheita - em alguns casos até mais - era para o dono da terra. Vida dura, mas necessária para alimentar uma família. Neste tempo, nas zonas rurais, a principal fonte de subsistência era a terra e o gado. Quem tinha um “pedaço” de terra e uma vaca no palheiro, desenrascava-se. O leite da vaca era uma importante fonte de rendimento. As famílias, por norma, eram grandes. Todos ajudavam nas lides do campo: a cavar, a regar, a mondar, a tirar leite ao gado. Fosse o que fosse, todos ajudavam. Era assim que se fazia pela vida. Era assim que se ia buscar algum rendimento para por uma família a funcionar. Em muitos casos, com sacrifício acrescido para dar “estudos” aos filhos, para que um dia fossem alguém na vida. Há três ou quatro décadas, na minha zona, os terrenos estavam todos cultivados. A necessidade era tanta que não havia beira que não fosse aproveitada. Por vezes, com a ânsia de se aproveitar tudo ao máximo quase que se invadia o terreno do vizinho.
Muitas vezes as brigas sucediam-se, muitas delas até com consequências trágicas. Eram tempos muito difíceis. Por essa altura, a atividade agrícola era o principal sustento. Uma vida pobre que dependia muito do que a terra dava. Com o andar dos tempos, felizmente, as coisas foram se alterando. Nessa altura, quase que só havia uma saída: emigrar. Foi assim, durante décadas, o sucesso dos que regressavam para visitar a família incentivava outros. Com o andar do tempo, felizmente, foram surgindo outras oportunidades, sem ser necessariamente a saída de casa. A construção civil foi umas das áreas que retirou muita gente da terra.
Ganhava-se mais, e as obras que começaram a surgir em grande quantidade por toda a ilha começaram a absorver grande parte da mão-de-obra que trabalhava no campo. O rendimento era outro. O reverso de tudo isto é que começou a faltar gente para trabalhar na terra, e os campos outrora trabalhados começaram a ficar abandonados. A dimensão da propriedade, associada à falta de rendimento, obviamente, que não garantiam o rendimento necessário para alimentar famílias. Muitos foram resistindo, mas a agricultura passou de atividade principal a fonte complementar de rendimento. Uma forma de ter produtos da terra, de melhor qualidade, para a alimentação do dia-a-dia.