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Artigo de Opinião

Bispo Emérito do Funchal

1/09/2024 07:45

Dentro em breve será canonizado o Cardeal e Patriarca de Veneza A. Luciano, certamente aquele que conheci como Bispo de Agordo, no Piemonte Italiano, ao qual me dirigi como Vice-Reitor do Pontifício Colégio Português, preparando a peregrinação após a Páscoa para os alunos do Colégio.

Cheguei como um desconhecido parti como um amigo. O Bispo chamou uma sua irmã encarregada das casas da diocese e, dizendo a data, indicou-me a casa para a nossa permanência.

Algum tempo depois era nomeado Patriarca Cardeal de Veneza.

Na Igreja Católica, existem apenas três Patriarcas, o Papa de Roma, o de Veneza e o de Lisboa. Desta forma tive ocasião, como secretário do Senhor Patriarca Ribeiro de me encontrar com o de Veneza.

Antes de ser eleito Papa tornou-se o Patriarca Luciano, considerado o mais humilde de todos os Bispos italianos, e, apesar disso, muito conhecido pelo belo e original livro “Illustrissimi” em que ele entrevista clássicos e famosos, tais como Dante, Petrarca, Goldoni, Manzoni, Dickens, Twain, Belli, Trilussa, Gogol, Tolstoj, São Bernardo, São Bernardino, Santa Teresa de Ávila, Santa Teresa de Lisieux e, particularmente, São Francisco de Sales.

Nesta ocasião preparatória da canonização, no Palácio Ducal de Veneza, com um novo Prefácio dos “Illustrissimi”, pelo Cardeal da Cultura, conhecido em Roma pelo douto Madeirense, de Machico, Cardeal Tolentino Mendonça.

Muito se tem falado da cultura de Luciano, sempre integrada na sua missão de evangelizador e mestre da fé e da moral cristã. Os temas que lhe são mais queridos são a pobreza e a humildade. Apesar disso as suas cartas são enriquecidas com anedotas encontradas na Enciclopédia das anedotas, para dar vida aos discursos e com exemplos completos e pequenas histórias. Comprei em Roma o seu livro que me ajudava a sorrir, quando era avassalado com problemas com os padres que queriam e deixaram o sacerdócio, até da Madeira. O Patriarca não escrevia para mostrar a sua cultura, mas para servir e ajudar a refletir os seus leitores e ouvintes nos diversos retiros que teve de dirigir. Escrevia como o bom pastor do rebanho que Deus lhe confiara. Recordo também, quando já era Papa, e nas poucas Audiências que realizou na Basílica de São Pedro, que colocava um menino ou dois junto de si para falar aos fiéis que tinham vindo para a Audiência.

O seu livro “Illustrissimi” era uma pequena “Summa” do seu magistério religioso, social e moral, nele sente-se a experiência, respira-se a vida.

Tinha um grande interesse pela imprensa e as edições católicas, a sua atenção pelo cinema e o Festival de Veneza, não tinha receio de intervir nas relações entre arte e moral sobre a qual muito se discutia nesse tempo.

Quando no livro fala com Goethe diz-lhe se ainda escreveria as suas cartas Imaginárias, hoje fragmentária e confusa, a sua linguagem sempre respeitosa continua a ser um exemplo luminoso contra o ódio e a violência, porque a comunicação sirva para unir e edificar. Tem reflexões sobre a “nostalgia do puro”. Refere-se aos romances históricos que tinham um grande sucesso no seu e meu tempo, hoje quase esquecidos, dizia então: “Honra e glória ao escocês, pai do romance histórico e limpo”. Entristecia-se com a “imprensa malévola”. O Patriarca referindo-se ao escritor Manzoni no livro, “Os Noivos (I Promessi Sposi), refere as palavras de Ludovico de Casoria: “É um livro que poderia ser lido num coro de virgens presidido por Maria Santíssima”.

Quando o Patriarca Luciano se encontrava em Veneza, o Papa Paulo VI, tirou a estola que trazia e colocou-a ao pescoço de Luciano. Era um sinal a ter em conta.

Ele se inspirava fielmente à sabedoria, autoridade e paciência de Paulo VI.

No tempo em que estava em Veneza, não era fácil governar com as tenções fortes na sociedade e na Igreja. O Papa Francisco recorda que não vê mais televisão. Não perde muito, mas é uma exceção.

Após a morte de Paulo VI no verão em Castel Gandolfo os Cardeais vieram para Roma com um calor tórrido. Vim também com o Patriarca Cardeal Ribeiro, todos os dias de manhã os Cardeais se reuniam na Basílica de São Pedro para a Eucaristia, sendo eu seu Secretário. Os Patriarcas estavam juntos, ajudava o Cardeal Ribeiro a paramentar-se, o secretário do Patriarca Luciano, por vezes, não aparecia, e eu ajudava também o Patriarca Luciano, uma vez disse-lhe: “Eminência eu ajudei-o a estar bem preparado para quando vier o Espírito Santo pousar sobre Si”. Ele fixou o Cardeal Ribeiro e perguntou-lhe: Quem é este Menino?” Diz o Patriarca de Lisboa: “É o Reitor do Colégio Português. Desculpe-me, desculpe-me Senhor Reitor”. E todos rimos.

No dia do Conclave, levei o Patriarca Ribeiro ao seu cubículo e disse-lhe: “Já sabe qual é o meu candidato, e rimos. Após o Conclave com a “fummata bianca”, a indicar já temos Papa fui de novo ao Vaticano para trazer o Patriarca Ribeiro, que não podia revelar o nome e diz-me “Vais ter uma surpresa!” Viemos ambos para a Praça de São Pedro e o Patriarca Luciano era o novo Papa, João Paulo I. No mês de setembro realizou quatro Audiências Gerais, dedicadas à humildade, à fé, à esperança e à caridade.

Um dos escritos mais substanciosos deste Papa, é o diálogo com São Bernardo, que deve ser lido pelos pastores da Igreja, pelos governantes e os políticos.

Finalmente, ao chegar o 33º dia do seu pontificado, o “Senhor libertou aquela alma piedosa e santa do seu corpo”.

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