A evolução da ciência e da tecnologia permite-nos viver cada vez mais, com melhores condições e maior qualidade de vida. Todavia, esta realidade não é igual para todos. Por vezes, viver mais não está associado a viver com qualidade ou com as mínimas condições de vida. Infelizmente, os idosos compreendem bem esta realidade porque deparam-se diariamente com a degradação do seu corpo, com a diminuição de capacidades, com a necessidade de cuidados de saúde permanentes e específicos, com o isolamento e exclusão social, com as vidas exigentes dos seus familiares em idade ativa e com as diversas transformações da família e da sociedade moderna. Estas situações conduzem, em alguns casos, à institucionalização da pessoa idosa.
Os lares de idosos apresentam-se, teoricamente, como a melhor alternativa de cuidado. Um refugio respeitador do envelhecimento e que procura oferecer, nos últimos anos de existência, qualidade, saúde, atenção, assistência e carinho. Alguns cumprem com a sua verdadeira missão, outros, oferecem autênticos cenários de terror: idosos caídos no chão, deitamos em cima de terra, de um vaso derrubado; idosos deitados em cima das próprias fezes; idosos que ingerem iogurtes fora do prazo de validade; idosos que não são higienizados durante vários dias; idosos que sofrem maus-tratos e que são tratados como indigentes.
Segundo alguns testemunhos, o lar onde a idosa coberta de formigas faleceu, alberga um pouco mais de seis dezenas de idosos, porém, não existem enfermeiros suficientes para garantir o bem-estar de todos. Aparentemente, existe apenas uma enfermeira, que não é substituída nas suas folgas e, os enfermeiros auxiliares, demitem-se por falta de condições. Acredito que, muitos lares estejam a passar pela mesma situação, pois, a maioria da população institucionalizada é muito dependente, doente, vulnerável e envelhecida, consequentemente, há uma subcarga de trabalho e uma enorme falta de funcionários. Acrescenta-se a precariedade da profissão e do emprego e a falta de formação técnica e (bio)ética dos funcionários, o que dificulta a prestação de um cuidado humano e centralizado no idoso.
A idosa coberta de formigas faleceu um mês após este terrível episódio. Como é que ela se sentia com tanta indiferença, negligência, friez e descuido? O que é que ela pensou quando viu o seu corpo a ser invadido por formigas? É entristecedor pensar na possibilidade de alguém sentir-se morto, mesmo estando vivo, devido à falta de humanidade e de cuidado de terceiros; querer pedir ajuda e não ter a quem; querer denunciar os maus-tratos e não ter capacidade para tal.
No silêncio, muitos idosos gritam por ajuda, por humanidade, por cuidado, por limpeza, por dignidade... As instituições devem ter ética no cuidar, devem respeitar a dignidade humana de cada utente, devem estar disponíveis para os idosos mas também atender às necessidades dos funcionários, criando boas condições de trabalho e formando cada pessoa para a ética do cuidado, um cuidado humano.