As férias grandes estavam quase a chegar quando vinha o São João e meu pai levava uma semana inteira à noite a fazer balões de papel de seda e a colá-los com milho.

Chegaram as Férias Grandes! Os pequenos assobiam na eira, chamam uns pelos outros, combinam coisas, têm os olhos brilhantes e extasiados! - Passaste de ano?

- Sim, por baixo da carteira! Meu pai deu-me um calor! Fiquei uma hora de molho!

- Bem feito!

- Bem feito é um macaco sem jeito! Teu pai é torto e o meu é direito!

- O que vais fazer hoje?

- Vou jogar pedradas, altear joeira, brincar aos polícias e ladrões, lançar-me pela ladeira abaixo no meu carrinho de esferas que o meu padrinho me deu, fazer um carrinho de canas mais o meu primo Jorge, apanhar lagartixas com erva num arco e correr atrás das pequenas a meter-lhes medo! Vou à festa da igreja, vou ver a romagem e sair na procissão! Vens?

- E vai dar tempo para isso tudo?

- Vai! O dia é enorme! As férias são grandes! Vens nadar no poço do ti Augusto?

- Meu pai diz que me dá uns carrolaços a dobrar, se o Augusto furtar a roupa à gente e eu tiver de vir para casa nu.

- Cá nada! O Augusto está velho, já não dá carreiras nem apilha a gente! Isso era dantes que era preciso subir às árvores para fugir dele!

- O Pedro vai?

- Não! Tem de arear as bancas à mãe, varrer o terreiro e acartar água da fonte!

- Coitado do desinfeliz!

Chegaram as Férias Grandes! As pequenas visitam-se, brincam ao pai e à mãe e às pedrinhas, arrumam a casa das bonecas, bordam e preparam coisinhas, desenham lindas flores e frutos, raminhos e ramagens em toalhinhas e paninhos. Aprendem os lavoures e a serem donas de casa como deve ser! Passam as tardes à sombra das ameixeiras ou das anoneiras rindo e conversando! Fazem croché e aprendem tricot, a novidade no sítio trazida pela senhora Lídia que regressou da Venezuela! Ouvem música pedida e leem fotonovelas! Cantam "Uma gaivota voava, voava"! Fazem passeios na levada dos tornos, ajudam as mães nas limpezas e a mudar a terra das flores. As camas de lã de ovelha vêm para a rua, são arejadas, batidas e mexidas! Tudo frescura!

As pequenas e os pequenos juntam-se na eira a conversar e a rir até doer a barriga! Brincam ao lenço, ao anel, à matança, aos escondidos, à verdade e consequência…

As Férias Grandes começam a acabar quando o senhor Cândido apanha o trigo e vai debulhá-lo e as ameixas de tão doces e maduras começam a pingar nas árvores sem ninguém as cobiçar!

As Férias Grandes estão quase a acabar quando a tia Elvira nos manda apanhar amoras maduras, boas para fazer doce; quando eu faço anos e meu pai traz um bolo tão bom das "Minas Gerais" e uma laranjada de litro!

As Férias Grandes estão quase a acabar quando meu pai faz o vinho e tira a folha da vinha do corredor do terreiro para não fazer cisqueirada e ser mais fácil de minha mãe varrer!

No fim de setembro, as pequenas e os pequenos juntam - se na eira ao fim da tarde a olhar o céu cheio de andorinhas a partir aos bandos!

- Adeus! Adeus! Voltem para o ano! Boa viagem!

Cheira já à escola! A pasta do ano velho serve para este ano novo! Não está tempo para deitar fora! A borracha também safa! Ninguém é um tabelião a apagar! O pai já comprou o forro novo e o plástico para voltar a forrar os livros que já foram da mana mais velha e da prima que já é pretérita-mais-que-perfeita e podem ainda servir para mais algum primo ou prima que venha a seguir! A bata do ano passado está curta! Vem a bainha abaixo e fica nova! Bem engomada, ninguém vai reparar no vinco! Os sapatos pisam, tira-se-lhes uma meia-lua à frente e aliviam os dedos! Com uma peúga da mesma cor ou mesmo branca, ficam bem! Estás a crescer!

Tudo bem pensado! Estou pronta para a escola! Não me falta nada! A escola chegou! Obrigada por ter chegado!

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