O grande, diria até magistral marionetista é claramente António Costa, a forma como consegue pegar numa desgraça ou numa completa tragédia e transformá-la num conto de fadas é de facto assinalável. E isto apenas com umas figurinhas tristes em papel (leia-se ministros e secretários de estado) e uma fonte de luz, que nos tempos que correm não são já as lamparinas, mas sim sofisticados focos de leds (leia-se comunicação social amiga). Veja-se um exemplo de uma peça recentemente estreada. Em Odemira (povoação aprazível e solarenga), imigrantes infectados com Covid (azar do caneco), uma cerca sanitária (há que ser duro), uma carga da GNR (não estamos aqui para brincadeiras) e a requisição de um complexo turístico para acudir os pobres dos trabalhadores (somos mesmo socialistas e não gostamos de capitalistas) e pronto está feito o espetáculo. Isto foi a sombra projectada na tela, aquilo que o Governo quis que os portugueses vissem. A realidade, mais complexa, mais densa e que passou completamente ao lado foi um combate ineficaz à pandemia, um controlo de fronteiras inexistente, uma fiscalização laboral míope, um desrespeito completo pela propriedade privada e a permanência no governo de um ministro da administração interna completamente inútil e incompetente.
Mas seria ingenuidade pensar que este teatro de sombras é levado à cena apenas pelo governo. Certos partidos, ou melhor todos os restantes partidos também já vão dominando esta arte do encanto e do engano. As meninas do Bloco, a quatro ou a seis mãos (sim, porque esta malta é muito liberal... nos costumes) lá vão contando as suas histórias. Com uma ajuda preciosa na intensidade e na direcção da luz (que vem quase sempre da esquerda para a direita) lá explicam o inexplicável ao ponto de conseguir convencer o triste do português que o Hamas é o congénere palestiniano do Coro Infantil de Santo Amaro de Oeiras.
O Ventura, apenas com duas mãos (sim porque este senhor não gosta de misturas) à custa de uma luz que seria supostamente para o encegueirar, lá consegue amplificar os seus monstros e devaneios, arregimentando a cada dia que passa mais incautos para a sua causa e para a sua casa. No PSD, Rui Rio, o marionetista de serviço, apesar de contar uma história inspirada em factos verídicos (uma história triste e que vai acabar mal) o pouco jeito de mãos e a luz desastrosa não ajudam. Além do desempenho não ser lá grande coisa, o facto da companhia concorrente ter em cena muitas peças, cada uma mais rocambolesca que a outra reduz claramente a atenção e a disponibilidade do povo para histórias mais sérias.
Mas esta arte não se ficou pelo rectângulo e atravessou o Atlântico, pois na Madeira temos já um punhado de aprendizes de marionetistas socialistas devotos. A peça de estreia foi levada à cena nas últimas eleições regionais e com a ajuda de uma equipa muito profissional e dispendiosa para as luzes quase que enganavam toda a plateia. A história era bonita, havia pessoas, toda a gente era feliz, havia pessoas, todos sorriam, havia pessoas, e tinham planos e estratégias para as pessoas. No fim, quando caiu a tela, a plateia ficou atónita, onde estava o marionetista eloquente e bem-falante? Parece que a peça não era dele, a história era uma adaptação de uma novela mexicana e o marionetista era afinal um primo de um cantor romântico espanhol.