As eleições autárquicas de 12 de outubro deixaram, na Madeira, um conjunto de sinais claros sobre o estado atual da política regional e local. Talvez por serem as mais próximas, as mais intensas e, para muitos, as mais difíceis. Porque nelas se joga sempre mais do que a gestão de um município. Joga-se a identidade de cada comunidade, o sentimento de pertença e, em muitos casos, a única oportunidade de expressão política de quem quer representar a sua terra.
No cômputo geral, foi uma vitória importante de Miguel Albuquerque, que volta a solidificar o seu projeto político e a demonstrar que, neste momento, não existe uma alternativa visível à sua liderança. Os resultados traduzem a consolidação de um ciclo e o reconhecimento da estabilidade política que o PSD tem assegurado, num contexto de grandes mudanças e volatilidade externa.
No Funchal, a vitória de Jorge Carvalho merece destaque pela serenidade e sentido de responsabilidade com que conduziu a campanha. Mostrou que, na política, o fogo de artifício raramente vence. Perante uma oposição fragmentada, obteve uma maioria absoluta convincente, num ato eleitoral que marcou o fim definitivo da liderança de Paulo Cafôfo sobre o PS-Madeira, incapaz de apresentar um candidato mobilizador, remetendo o partido que outrora foi alternativa regional a um humilhante quarto lugar.
Em outros pontos da Região, o PSD demonstrou capacidade de crescimento e afirmação de alternativas locais. Na Ponta do Sol, a vitória de Rui Marques foi provavelmente a mais expressiva, não apenas pelo resultado, mas pelo significado político de derrotar uma incumbente e renovar a confiança dos pontassolenses num novo ciclo de governação. Em Santa Cruz, apesar de não ter havido vitória, o partido conseguiu apresentar um caminho e uma alternativa, preparando o terreno para, daqui a quatro anos, disputar com seriedade o segundo concelho mais populoso da Região.
O caso mais sensível verificou-se em São Vicente. A mudança de candidato, a meio de um processo tenso e politicamente desgastante, revelou-se prejudicial para o PSD. Foi a primeira vez que manifestei publicamente a minha opinião quanto à escolha do candidato, apoiando a solução Fernando Góis – Aires dos Santos, que, acredito, reunia as condições ideais para garantir estabilidade e renovação. No entanto, prevaleceu uma candidatura que procurava a continuidade direta com a atual liderança cessante, o que acabou por ser mal interpretado pela população. E acreditem que tive muita dificuldade em explicar, a observadores distantes, como é que quem estava dentro significava a alternativa e quem estava fora corporiza a continuidade!
Como tantas vezes sucede, o eleitorado vive durante anos um verdadeiro idílio político com um determinado representante. Até ao dia em que se cansa e o rejeita, levando consigo todos os que lhe estão associados. Foi o que aconteceu. José António Garcês teve anos de grande empatia com a população, mas esse ciclo encerrou-se irremediavelmente.
O PSD perdeu o poder e todas as juntas, não para um movimento independente, mas para um partido com uma atitude declaradamente hostil ao projeto social-democrata. Isso cria um contexto complexo: de um lado, uma estrutura que perdeu a confiança da população; do outro, um novo poder cuja capacidade de governação e reivindicação junto do Governo Regional suscita fundadas dúvidas.
São Vicente vive, por isso, um impasse, entre um passado político que se esgotou e um presente incerto quanto à competência do novo executivo. O desafio do PSD não deve ser o de virar costas ao concelho, mas o de reconstruir uma alternativa credível, que reconquiste a confiança popular e volte a ser o elo entre o Governo Regional e os anseios daquela população genuinamente social-democrata.
O futuro passa por renovar as lideranças locais, através das próximas eleições para as comissões políticas, e identificar figuras com capacidade reivindicativa e ligação à comunidade. A solução não é “esquecer politicamente” São Vicente, mas preparar, desde já, o regresso, demonstrando que o PSD continua a ser a força política que melhor compreende e representa o povo são-vicentino, que a História sempre demonstrou ter uma personalidade muito própria, mas que continua a ser, intrinsecamente, social-democrata.