Não vou discutir o trabalho do Juiz Ivo Rosa, não estou habilitado para isso, nem vou condenar José Sócrates, porque dele tratará a justiça. Tal como a muitos milhões de portugueses cheira-me a esturro mas não sucumbo à tentação de fazer julgamentos. Nisso António Costa tem razão: à política o que é dos políticos, à justiça o que é da justiça.
A corrupção é um mal muito mais generalizado do que é sentido e normalmente a essa palavra está associada uma outra: desenrasca. Não vale a pena fingirem-se de virgens vestais porque as negociatas são mais do que muitas e se fosse para as enunciar estes 3500 caracteres a que tenho direito, aqui no JM, não davam para meia missa.
A administração pública, seja ela nacional, regional ou local, bem como alguns órgãos de soberania, onde gravitam os tribunais, são antros desse fenómeno. A criminalização do enriquecimento ilícito, numa forma mais precisa e aprofundada, traria à luz do dia muita coisa impensável.
A EDP e a venda de meia dúzia de barragens, com malabarismos legais e fiscais pelo meio, é um bom exemplo da vergonha que vai por esse país fora, com contornos ainda não inteiramente apurados mas que se prevê irão dar água pela barba. Um autêntico escândalo!
Vergonhoso, alguns dirão corajoso, foi também é o fez Fernando Medina, um mago da retidão. Na ânsia de ganhar mais uns votinhos nas próximas autárquicas, não hesitou em fazer o que o que Ivo Rosa não fez; condenar Sócrates em direto e com toda a sapiência.
Esqueceu-se que pertenceu a um dos seus governos e que o venerava e lhe estendia o tapete vermelho para que passasse não sendo, contudo, o único secretário de estado que fazia isso, havia mais. Não quero com isto dizer que seja corrupto, mas há coisas que são do domínio público que lhe foram atribuídas e das quais se defendeu na comunicação social. Penso que se sentiu injustiçado, com todo o direito,
Coincidência das coincidências, 3 ou 4 dias depois de açoitar Sócrates, sucumbindo à vertigem oportunista está a braços com um problema idêntico na sua Câmara, provavelmente de menor espetro que tem a ver com o ex-vereador do Urbanismo da sua Câmara, Manuel Salgado, primo do Salgado do BES.
Claro que está de consciência tranquila, até parece que não é ele o principal responsável, só por ser o Presidente, mesmo que não tenha recebido qualquer vantagem e tudo desconhecesse. Foi corajoso, sim e populista, ainda mais. André Ventura não faria melhor. O discurso anticorrupção não é para quem quer, é para quem pode.
Já em matéria de financiamentos partidários toda a gente sabe, por exemplo, que aqui há uns anos as grandes construtoras nacionais e outras financiavam os dois maiores partidos portugueses, daí a ultima alteração à lei de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.
Neste caso, nem que seja só por isto, também não há virgens e ver partidos a atirarem sobre outros partidos, também não me parece sinal de grande discernimento.
Atirar "matéria" para a ventoinha nunca foi grande ideia, pode atingir todos São assuntos sensíveis que contribuem para o descrédito dos políticos e dos seus partidos de uma forma muito generalizada, que devem ser encarados responsavelmente mas sem alaridos, muito menos se tiverem na sua génese a caça ao voto ou o acerto de contas.
Mesmo que alguns cumpram, na integra, as regras, e sei do que falo, quando se envereda por esse discurso pode-se estar a dar um grande tiro nos pés, como fez Fernando Medina.
Quiçá seria mais inteligente apertar a malha legal do que apresentar queixas, aqui ou ali, que normalmente dão em nada. O enxovalho não é uma arma digna, a razão e a legalidade, sim, mesmo que isso tenha custos.
A democracia exige-nos isso.