Os meus pés não sentem já o frio do Verão, nem a água do corpo por cumprir, como se os pássaros fossem homens e viessem de longe e nunca chegassem.
Há um tempo que vem corrigir-nos o desejo e secar as nossas mãos tão gastas de procurar. Porém, o tempo não chega onde não vemos, onde não vamos. Então, deito-me sobre o teu peito como se esse calor viesse ainda do princípio, ou de uma rosa muito viva no meio do escuro onde me perdera; eis a sua escarpa inesperada visitando-me como um sinal. São afinal as árvores que caem das folhas, depois de adormecidas por mãos que desconheciam. Depois.
Eu já nem sei de outras mãos, de outro calor de Outono onde fui morrer. Ter. É na claridade que toda a luz se apaga, quando os dedos de uma mão não servem já para indagar uma noite qualquer, apenas uma única noite voltada para o primeiro dia. Se eu morrer, promete que virás devolver-me o clarão do escuro. Bem sabes como temo que os meus olhos ceguem ao sol. Não sabes?
Hei-de entrar pela berma do corpo, pela mão mais aflita sobre a minha cabeça. Não saberei, talvez, procurar a noite ou o lado contrário do teu rosto que me visita. O tempo terminará ao começo de cada corpo, apagando com ternura a flor que se despede da água, mas eu hei-de enganar-me e inclinar-me para os teus olhos, como se sobrevivesse e pudesse. E poderei ser árvore caída da folha, ferida funda onde o vento não toca. Caem as árvores das folhas, ainda que o Outono não limpe outras estações.
Se eu viver, não limpes o soro do meu corpo, pois não há-de ser inteira a desatenção de um corpo sobre o outro, ou de uma árvore sobre a guerra, calor inoxidável que uma boca esmaga antes de esquecer, antes da velocidade que trava todas as luzes para dentro.
O Outono tem para a vida uma margem muito alta, o seu vente desabitado pronto para as flores que não hão-de cair. E virá, então, a profunda alegria do medo, o silêncio inaugural de um país que não veio ao mundo para nascer.