E se no Natal disséssemos apenas, verdades?
Todos nós já lemos livros ou vimos filmes, onde a personagem principal tinha um grave problema: não conseguir mentir.
Conheço alguém que há anos, foi a um casamento onde os convidados diziam “Como está bonito o noivo!”. Fiquei a pensar: aquela noiva não tinha amigas que a tivessem ajudado a brilhar, naquele dia especial. Bastava terem dito a verdade. Quantas pessoas elogiamos, mentindo?
A verdade é assustadora, porque a verdade de uns, não é a verdade de outros. Num acontecimento, há sempre várias versões da história. Avaliamos tudo o que se passa à nossa volta, sempre com a nossa história de vida a influenciar. A verdade é subjetiva.
Normalmente, não aguentamos a verdade de outros sobre nós, porque, às vezes, a verdade vem nua e crua, ou bonita demais para ser suportada. Já me aconteceu fazer um elogio e ouvir algo do tipo: “Estás a dar graxa?”
Temos tanta dificuldade em ouvir críticas, como em ouvir elogios. Há quem prefira fazer/receber críticas a elogios. Talvez porque tendemos a não querer valorizar o outro, porque isso pode nos inferiorizar.
Há algo que também nos condiciona: temos uma cultura que favorece a “paz podre”. Em todo o lado, em casa, em família, em grupos de amigos e de trabalho. Fingimos, para evitar conflito. Muitas vezes fugimos do conflito, com medo da nossa própria agressividade. Os conflitos não implicam violência. Por exemplo, quem é capaz de dizer a um colega que agiu mal na sua função? Ou dizer à tia que o bolo não está bom?
Mentimos ou omitimos? Normalmente, dizemos a nossa verdade em privado ou gritando nas redes. É difícil dizê-la em voz alta.
A maioria de nós, adultos saudáveis, sabe “mais ao menos” aquilo que é. Sabemos se somos bonitos, ou não, e se somos boas pessoas, ou não, até se somos inteligentes, ou não. Quantos de nós ouviram essas verdades de pessoas à nossa volta, por exemplo: “És boa pessoa!” ou: “És bonito/a” ou: “És um prefeito idiota” ou:” És um grande vigarista”. Poucos?
Mas o estar calado é muito perigoso. Num mundo onde se diz a verdade um criminoso não vai longe. O nosso governo caiu, devido a alguns elementos do governo poderem ter cometido crimes. O crime implica a mentira.
Provavelmente existiram pessoas que aplaudiram alguém que já dava indícios de ser má pessoa. Um corrupto é má pessoa e nunca cresce sozinho.
Estamos no século do “desmentir”. Assustador.
Ouvimos alguém dizer o que tem. Depois, a mesma pessoa a dizer que afinal não tem. Ouvimos muito: “Eu disse isso?”
E depois passam gravações, nos programas humorísticos, com este desmentir.
O nosso Presidente da República, esta semana, disse que recebeu um email.
Desmentir é o novo normal. Na política, é rainha a tentativa de mostra paz, mesmo que seja podre. Já vi maldizerem pessoas hoje e, tempos depois, darem nessas mesmas pessoas pancadinhas de apoio nas costas. Quem é o pior? Serão estes que depois aparecem em processo criminosos?
A verdade é a única cura, para travar o crime nas instituições. A verdade na família pode ser a nossa salvação.
A vida que tivemos e a forma como crescemos vai descrever-nos. Ouvimos elogios? Fomos valorizados? Crescemos a ouvir críticas negativas? Ou crescemos no silêncio de uma paz podre? Segredos de família...
É verdade que há quem precise de mentir, para sobreviver na sua própria família. Triste...
Imaginem um Natal, onde não podemos mentir à nossa família. Será possível?
“Não fiz nada, porque não queria confusões!” Ouço frequentemente.