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Artigo de Opinião

Presidente da Delegação Regional da Madeira da Ordem dos Psicólogos Portugueses

28/03/2024 08:00

A recente publicação do World Happiness Report (WHR) 2024 tem dado espaço a muitas notícias e debate em torno de uma das suas conclusões, nomeadamente de que tem existido um declínio no sentimento de bem estar dos jovens ao longo dos últimos anos. Mais do que um estudo de profundidade, o WHR é um barómetro anual em 140 países e fornece-nos indicadores que podem ajudar uma discussão em torno do tema do bem estar que as pessoas relatam. A nível mundial, os jovens entre os 15 e os 24 anos continuam a reportar maior satisfação com a vida do que os adultos, mas esta diferença está a reduzir-se na Europa e inverteu-se nos EUA, uma inversão que é causada, não pelo crescimento da satisfação dos mais velhos, mas pela diminuição da dos mais novos.

A ideia de os jovens serem menos felizes do que gerações anteriores é um pouco desconcertante, em parte porque desafia a expetativa de que a vida deve melhorar de geração para geração, e a crença popular de que os jovens são à partida felizes, justamente por serem jovens.

Naturalmente, atribuir as mesmas características a todos os indivíduos de uma geração é abusivo e contribui para estereótipos. As pessoas são todas diferentes. Mas isso não tem impedido que se analisem tendências médias em vários indicadores de saúde e bem estar que diferentes grupos etários apresentam.

Ainda que este tipo de relatórios não discuta causas para os efeitos observados, tem existido um debate sobre a necessidade de as identificar, sobretudo quando o declínio se verifica em zonas mais desenvolvidas do globo. Várias propostas incluem a desigualdade, a crise da habitação, a guerra, a crise climática e a ecoansiedade, e o impacto das redes sociais e do lugar que ocupam na vida das pessoas. O que nos leva à necessidade de cruzar estes dados com outros que tenhamos disponíveis para poder estabelecer linhas de debate, já que certamente estes efeitos não decorrem de uma causa apenas.

Uma dessas opções corresponde ao conhecido estudo longitudinal de Harvard, que acompanhou centenas de indivíduos durante décadas, desde o final dos anos 30 do século passado. A amostra consistiu em homens de diversos contextos sociais e económicos, cujo bem estar e satisfação com a vida foram estudados regularmente. Invariavelmente, o fator que mais se destacou foi a qualidade e a natureza das suas relações interpessoais. Não foram os sucessos de carreira, os recursos, a capacidade intelectual, o estatuto ou mesmo a dieta - embora todos sejam relevantes - que contribuíram para os maiores indicadores de felicidade e saúde, mas sim as relações interpessoais com qualidade. O que, de certa forma, não admira, já que as relações próximas com outros significativos nos permitem ter mais segurança, crescimento e aprendizagem, intimidade e confiança, espaços de partilha, ajuda e oportunidades de lazer.

Nesta discussão sobre o que contribui ou não para as variações na felicidade, seja a dos jovens ou a dos menos jovens, é assim provável que a forma como cada um ou cada geração vive as suas relações, ou como em cada sociedade as pessoas se relacionam, seja um fator fulcral. Numa época do ano que muitos caracterizam como sendo de reflexão, talvez seja por isso importante recordarmos o que comprovadamente importa. Se a felicidade não é um destino, mas um caminho, então não esqueçamos o que realmente interessa para o percorrermos da melhor forma.

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