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Artigo de Opinião

HISTÓRIAS DA MINHA HISTÓRIA

4/02/2022 08:00

Após o Natal e enquanto não chega o São Valentim, há uma acalmia nos apelos consumistas, uma brecha usualmente aproveitada para promover a venda de coleções, talvez inutilidades, mas que, decerto, encontrarão os seus nichos de mercado ou não persistiriam nas campanhas, ano após ano. Pus-me a refletir sobre este gosto inerente aos seres humanos de recolher e guardar coisas. Poderíamos resumir ser um impulso determinado tão só pela satisfação do desejo de possuir. Porém, logo lhe reconhecemos outros significados, como sejam: o deslumbramento por determinado tipo de objetos; um desejo de exteriorização de estatuto social, quer seja económico ou intelectual; uma forma de resgate da história pessoal ou coletiva, ou o propósito de veicular conhecimentos.

Nos critérios de seleção de itens a colecionar pesam não só os interesses do colecionador como também aspetos da sua realidade e cultura. O madeirense, por exemplo, tem atração pelo colecionismo de plantas. No tempo em que quase todas as casas tinham um jardim, por mais pequeno, nele cabia um pouco de tudo, e as trocas entre vizinhos, familiares e amigos eram comuns. Tantas vezes ouvia: "há de arranjar-me um pezinho ou um galhinho" disto ou daquilo. Claro que o fascínio pelo mundo natural não é exclusivo nosso. Desde sempre, o homem levou e trouxe plantas e animais de um lado para outro, por vezes com resultados benéficos, outros desastrosos, quando as espécies inseridas em novo habitat se tornaram infestantes e suplantaram ou extinguiram a flora e fauna nativa. Muitas coleções iniciadas por viajantes e exploradores — curiosos ou académicos — estão também na base de museus botânicos e zoológicos de todo o mundo.

Com a proliferação de bens na era da Revolução Industrial, o colecionismo individualizado ganhou dimensão. Exacerbar o consumo foi fórmula para incrementar e manter a necessidade de produção contínua e assim alimentar a força laboral das fábricas. As pessoas passaram a colecionar: bonecas, livros, loiças e cutelarias, miniaturas de toda a espécie, etc. e, até hoje, o âmbito de colecionismo não parou de crescer.

No século XX, os Media ganharam fulgor e passaram a explorar este filão, não só publicitando a prática como apresentado programas dedicados a colecionadores, muitos dos quais sofrendo de transtornos de acumulação. Os colecionadores insurgem-se e afirmam haver uma diferença entre ser colecionador ou coletor. Para este último tudo se resume a um desejo obsessivo de possuir, enquanto o primeiro distingue cada um dos seus objetos, sabe-lhes a história e o significado. Cuida-os com esmero e é com agrado e orgulho que recebe a apreciação dos seus pares, os únicos que o entendem, já que os que não sintam atração pelo colecionismo menosprezarão a sua atividade, classificando-a como uma extravagância, um gasto inútil de tempo e dinheiro, e ocupação de espaço. No entanto, creio poder afirmar que, com maior ou menor persistência, todos temos algo de colecionador, seja de selos, cromos, moedas, pacotes de açúcar, frascos de perfume, fotos e vídeos, souvenires de lugares visitados, etc. a lista seria longa. Um dia, deparamo-nos com a questão: o que fazer com tudo isto? E, a menos que seja coleção merecedora de museu, a resposta será: lixo!

Dolorosa conclusão, não é? É por isso que, cada vez mais, lembro as palavras do meu pai quando dizia que "o Saber é o único bem que vale a pena acumular; não ocupa espaço e é riqueza que ninguém nos pode roubar".

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