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Artigo de Opinião

GATEIRA PARA A DIÁSPORA

17/01/2023 08:00

Vi também o filme do georgiano Alexandre Koberidze What do we see when we look at the sky? (O que vemos quando olhamos para o céu?). Outra pepita neste pontinho da Via Láctea em espiral em que vivemos. Não é possível falar da Geórgia sem falar da sua mais famosa avenida, Rustaveli (nome de um poeta medieval georgiano), em Tbilisi. Numa das pontas da avenida, situa-se a Filarmónica - nome que aprendi a dizer aos condutores de mashkhutka (uma espécie de machimbombos soviéticos) para saber se subiam a avenida. Na outra ponta, a Praça da Liberdade, erguida após Sarkozy ter mediado o acordo de paz que pôs cobro à guerra de 2008 entre a Geórgia e a Rússia. Não muito longe dessa avenida, aventurei-me certo dia pela Academia de Belas Artes, onde encontrei a Nini, que me indicou o Café Gallery - estava à procura de um lugar onde pudesse trabalhar. Adoptei o café, que vim mais tarde a saber ser um dos centros LGBTI da capital, por vezes alvo de ataques por essa mesma razão e pela sua não conformidade. Certa vez, entrei também numa galeria. Nas paredes, um quadro denominado Democracia, representando uma mesa pantagruélica. Os comensais reuniam-se à volta de Putin, e virando o quadro, à volta de Bush filho, que eram o rosto de uma mesma cara. O autor era o Misha, e ficámos amigos.

A Geórgia tem uma história de mulheres fortes como a rainha Tamara, que liderou entre os séculos XII e XIII um império pan-caucasiano. Foi também disto que me lembrei quando vi os corpos femininos que habitavam o filme nos seus vestidos primaveris em Kutaisi, cidade onde decorre a acção. A fotografia do filme era apresentada como filigrana - a delicadeza do ombro, a imponência do rosto, os pés quando não caminhamos. Vivia-se o Campeonato do Mundo de Futebol, e Giorgi tinha por ídolo Messi. No dia da final, Giorgi pergunta a Lisa se quer que a acompanhe até casa, paredes-meias com o rio Rioni. Esta diz que sim e o trajecto até casa é entrecortado pelos festejos dos golos. Falharam a final, mas marcaram o início. Giorgi e Lisa, que se vão encontrando e desencontrando ao longo do filme não duvidaram um do outro, ou se isso aconteceu mantiveram a esperança neles e no acaso (apesar de, como Giorgi sugere, por vezes também é bom forçar o acaso).

Há dias, quis comprar um jornal vendido pelos sem-abrigo à saída de um supermercado. A senhora contou o troco numa língua que me parecia familiar. Era o georgiano. Começámos a falar do país e uma corrente maior do que a do rio Rioni saiu-lhe pelos olhos. Pediu-me desculpa e disse que a situação está muito difícil. Perguntava-me, balbuciando, porque é que tem de ser assim? O que sei é que não podemos dar a mesma resposta do recente filme Ernest et Célestine, Le Voyage en Charabie: «é assim e não pode ser de outra maneira».

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