Vem este intróito a propósito da alteração ao denominado Regulamento Municipal de Políticas de Incentivo à Natalidade, da Câmara Municipal de Santana, que permite duplicar o apoio concedido para 200,00€, por um período de 36 meses.
Sem dúvida que é uma boa notícia para os beneficiários, mas esta medida promove efetivamente a natalidade? As pessoas vão passar a ter mais filhos? Foi feita alguma avaliação que tenha aferido os resultados deste apoio, que já é concedido há alguns anos? Mais, esta é uma medida de Justiça Social?
Comecemos pelo óbvio: não há qualquer evidência científica que nos mostre que a natalidade está dependente das condições económicas, seja dos casais ou das nações. Aliás, é nos países desenvolvidos que há maior quebra da natalidade e índices de fecundidade mais baixos.
Os investigadores apontam inúmeras razões para a quebra da natalidade bem como medidas para reverter a situação. Há países, como os escandinavos, que têm medidas ativas e políticas integradas de promoção da natalidade, que passam por cuidados para grávidas, escolaridade gratuita, cuidados de saúde maioritariamente gratuitos, longas licenças parentais, subsídios, redução de tempo de trabalho, majoração na contagem de tempo para a reforma, definição de regras que tornem os espaços públicos amigos da crianças, entre outras e mesmo assim não reverteram a tendência.
Infelizmente, ainda não foi encontrada a fórmula que nos mostre o caminho inverso ao inverno demográfico, mas o que já sabemos é que a confiança que podemos ter no combate à baixa natalidade pode ser manifestamente exagerada. A quebra da natalidade e os baixos índices de fecundidade podem não ser reversíveis uma vez que as suas causas podem ser de ordem civilizacional, como a decadência das instituições e dos valores tradicionais e a dinâmica e mobilidade geradas pela globalização. Pura e simplesmente, não sabemos!
Voltando ao caso de Santana, a confiança na medida é tão baixa que logo na nota justificativa é afirmado: "a proposta de alteração é justificada pelo reconhecimento das limitações que as famílias se debatem, no que concerne à disponibilização de recursos, consequência do atual panorama mundial." Neste caso em concreto, parece que o objetivo não é promover a natalidade, mas apoiar financeiramente os munícipes. O que até seria louvável, se a medida não fosse cega e se fosse de facto uma medida social. Se gerasse valor ao nível da justiça social e promovesse a redistribuição da riqueza. Se fosse uma função social do Estado. Por outras palavras, se os apoios fossem concedidos a quem deles efetivamente necessita. Mas, uma vez que são oferecidos independentemente das condições sociais dos candidatos, estes apoios, agora reforçados, são iníquos e inócuos e não geram rigorosamente valor nenhum. Um desperdício de recursos do Estado e de dinheiro público. Não promovem a natalidade, nem a equidade, nem a coesão social!
Eu não desmereço nem desvalorizo a bondade da ideia. Todavia, acho que o investimento que a autarquia faz neste programa seria muito mais reprodutivo e eficaz socialmente, e - quiçá? - com maiores efeitos no combate ao decréscimo da população, se fosse investido de outra forma.
Claro que Dinarte Fernandes não está sozinho: distribuir subsídios sem critério de justiça social já contaminou inúmeros órgãos de administração pública. E cada qual quer sempre dar mais do que o outro. Todavia, não é por ser regra que está certo. Nem é por ser popular, que é justo. Para acabar com a subsidiodependência, é preciso acabar com a política do subsídio. E para acabar com ambas, é fundamental que o denunciemos!