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Artigo de Opinião

Comunicação - Assuntos da UE

17/05/2023 08:00

Este fim-de-semana passado, estive em Portugal em trabalho. Apercebi-me o quão sentia falta de trabalhar em Português. De expressar-me em Português para além da minha vida pessoal. Nos diversos contactos que fiz durante a viagem, praticamente todos disseram-me o mesmo: a vida em Portugal está difícil, não voltes tão cedo. Tantos desabafos e conversetas de café sobre o custo de vida que aumenta a um ritmo frenético que o salário nacional não consegue acompanhar. Famílias que são obrigadas a escolher entre pagar a conta da luz e comprar os medicamentos do mês.

Enquanto deslocava-me do meu hotel para uma das minhas reuniões no Porto, ouvi na rádio a notícia de que os pedidos de ajuda ao Santuário de Fátima aumentaram exponencialmente. Isto contrasta com o boom turístico em que o país está emergido. No centro do Porto ouvia pessoas a falar em inglês, francês, espanhol... Por muito que o turismo seja sempre bom, tudo o que é em massa tem as suas consequências. Tomemos Veneza como exemplo: só em 2019, a cidade recebeu 1.5 mil milhões de turistas. Os habitantes de Veneza passaram de 175.000 em 1951 para 50.000 em 2022. Temo que o mesmo já se esteja a passar nas mais populares cidades portuguesas. Há um aumento do custo de vida, aumento do custo da habitação, diminuição da qualidade de vida, falta de espaços para os jovens e falta de oportunidades de emprego. E, mesmo estando longe, apercebo-me disso em Bruxelas com a quantidade de jovens portugueses que têm-se mudado para cá nos últimos 3 anos - o meu primo acabou de o fazer há um mês; a minha melhor amiga mudou-se para a Bélgica no ano passado.

Sem cidadãos, Lisboa, Porto e outras cidades portuguesas perdem a mestria e o saber-fazer que mantém e manteve estas cidades vivas durante dezenas, centenas de anos. Começam a perder a sua identidade. Quando vivia em Lisboa, adorava passear por Alfama e ver os lençóis à janela. Haverá algo mais português do que isso? Quem irá pôr as roupas no estendal da rua se as pessoas são obrigadas a sair dos centros das cidades? Se estes centros tornam-se num grande alojamento local ou focos de Airbnbs?

Voltei esta segunda-feira para Bruxelas e fiquei a pensar no que fui ouvindo. Afinal, se calhar posso beber Leffe no parque em vez de Coral à beira-mar por mais algum tempo. Se calhar posso usar as receitas culinárias da minha mãe e fechar os olhos, imaginando que ela me está a pôr o prato na mesa. Se calhar as conversas profundas com amigos de longa data poderão continuar no WhatsApp até à próxima temporada de férias. Se calhar o meu coração saudoso terá de esperar. Porque infelizmente a minha antiga realidade ainda não tem espaço para mim nem para muitos como eu.

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