Esta semana estava bastante dividido entre continuar a escrever sobre os problemas do serviço nacional/regional de saúde e o momento histórico de 24 de janeiro e dias seguintes. Que tal juntar as duas?
A corrupção é algo muito antigo. Os nossos instintos levam-nos a favorecer as pessoas que conhecemos (família/amigos). Os estranhos, são isso mesmo, estranhos. Dificilmente encaixamos a noção de família humana e do valor que os estranhos têm. São poucos os que choram pelas mortes em países distantes, da mesma forma que choram por familiares seus.
Estamos todos sujeitos a formas de corrupção ética. Sobretudo quando tomamos a liberdade de comentar a vida alheia. Nestes últimos dias, temos visto, de lado e outro, acusações. Uns acusam os jornalistas e segredo de justiça, outros rebolam de alegria por finalmente sentirem justiça e vários tentam aproveitar as oportunidades do momento.
Se há alguma mensagem que quero passar neste momento atribulado é a mensagem que na Madeira vive-se uma opressão como nunca vivi em Lisboa. Cresci em Lisboa e vivi mais de 30 anos lá. Cá na Madeira vivo há 6 anos e posso comparar as duas realidades. Na Madeira as pessoas vivem oprimidas na sua liberdade de expressão e os favorecimentos são demasiado frequentes. Lisboa não é pura, claro que também soube de muitas situações, mas na Madeira é abundante. Como as pessoas conhecem-se da escola e relações familiares, é mais fácil e frequente pedirem favores, sendo esta atitude considerada “normal”. Mas o que me preocupa e que nunca tinha sentido é a opressão. Tinha dificuldade em imaginar o que tinha sido antes do 25 de Abril, mas com os acontecimentos que vivi nos últimos meses, soube. Um dia essa história será contada, mas não hoje.
Um partido que permanece na liderança por 50 anos, facilmente torna-se numa semi-ditadura. Tenta oprimir os outros partidos para não perder a liderança e a melhor forma é atacar diretamente as pessoas para que elas não queiram pertencer a outros partidos.
Na democracia é necessária a mudança, da mesma forma que toda a água estagnada apodrece, também todo o poder na mão das mesmas pessoas apodrece. É a natureza do mundo. Não compreender que a mudança é necessária, é sofrer desnecessariamente. Este é um ensinamento essencial do Budismo e que deve ser integrado nas nossas vidas. A nossa democracia deveria evoluir desta noção infantil que só pode funcionar com maioria absoluta, para a noção madura observada Suíça, em que diferentes partidos podem colaborar para uma solução governativa. Só haverá equilíbrio na política, se os vários partidos tiverem acesso e responsabilidade, pois aí vigiam-se uns aos outros para bem deles e de todos nós.
Na saúde, infelizmente a corrupção vem de tantas razões diferentes. Há pessoas a morrer à fome dentro de hospitais. Uma doente internada disse-me “disseram-me que já tive alta e que por isso não tenho direito a médico”. Esta senhora sente-se completamente desprotegida dentro do hospital. Nestes dias saiu a notícia de 221 doentes como casos sociais, mas a notícia que não sai é que estes são cidadãos de segunda num hospital. Ter de ouvir os boatos que o novo hospital tem menos camas que o HNM, menos blocos operatórios, a promessa da venda do HNM e saber que a região não tem uma solução organizada para estas situações, com o envelhecimento da população, preocupa-me. Talvez a ideia seja trocar madeirense caso social por turista, menos humanidade e mais dinheiro.