A revolução dos cravos traz-nos à memória uma revolta para paz. Foi o que aconteceu no dia 25 de Abril de 1974. Vetadas as saídas políticas para a questão colonial e com o número de vítimas e estropiados a se acumular só o derrube do regime poderia pôr fim a uma guerra injusta como a do Ultramar. Uma revolução militar sui generis - sem violência -, coisa rara na história.
Que o legado do 25 de abril nos reavive a memória para a importância da paz para uma sociedade progredir. Sem paz, não há liberdade, não há democracia.
Sem querer tirar conclusões ou fazer conjeturas enquanto a História está a acontecer, após a invasão Russa à Ucrânia, uma coisa tenho premente: ouve-se mais falar de guerra, armas, sanções, do que paz, cedências, liberdade e democracia. O que me remete para a mensagem mais corajosa e lúcida que ouvi estes dias relativamente ao conflito, por parte do Papa Francisco: "a compra e o fabrico de armas não são a solução" para a guerra, sendo necessário "trabalhar pela paz", "com a guerra, tudo se perde. Não há vitória numa guerra. Tudo é derrota". Que a sua mensagem nos faça refletir para os perigos da romantização da guerra, que tem lançado a Europa numa cruzada temerária e belicista.
O Papa Francisco foi das poucas personalidades com peso mundial que teve a coragem de criticar esta espiral de violência justiceira que tomou conta da Europa após a invasão insana da Rússia. Há que meter algum juízo na cabeça dos pregoeiros da guerra à distância, que confortavelmente sentados no seu sofá, defendem a resistência ucraniana a qualquer custo. Sem contar com os inevitáveis efeitos económicos desastrosos para todos nós, com a destruição do Estado Social, com o desvio de verbas para armamento, com a inflação que causará um empobrecimento gritante do povo europeu, com os lobbies do armamento e da energia a faturar milhões vergonhosamente. Não depender do gás russo significa voltarmos às energias altamente poluentes e perigosas que a Europa já tinha abandonado.
Com a invasão da Ucrânia, Putin fez a Europa regredir em dois meses, anos de avanço económico, civilizacional e ambiental. Há um antes e um depois da invasão da Ucrânia; criando uma nova agenda belicista que a Europa tinha abandonado e deitando por terra o compromisso de diminuir a pegada ecológica.
Com a existência de armas nucleares por parte de ambos os lados do conflito, podemos afirmar que ninguém vai sair vencedor deste conflito e quanto mais cedo compreendermos esta inevitabilidade, mais rapidamente podemos trabalhar num processo negocial. A invasão russa da Ucrânia configura o crime de agressão de um Estado a outro, inequivocamente, mas poupar vidas, vale mais, que este desejo de fazer justiça.
Sim, é melhor negociar com o diabo e "não deitar fora o bebé com a água do banho". Ambos os lados têm de fazer compromissos e cedências mútuas para cessar as armas. Há que trabalhar a diplomacia, mas que não sejam vistas como capitulações por qualquer dos lados é o único caminho para pôr fim a esta desgraça. Precisamente o contrário desta fúria guerreira que assisto nas redes sociais e nos media em geral, em busca de uma justiça, que só nos filmes do cinema acaba bem.