São Lucas, no seu evangelho, 2,29-32, regista um dos mais belos cânticos, entoado pelo velho Simeão, nome que em hebraico, Theodóchos, significa “recebedor de Deus”:
“Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz, porque os meus olhos viram a tua salvação, que preparastes diante de todos os povos, Luz que vem iluminar as nações e glória do teu povo, Israel!”.
Estamos no Templo de Jerusalém, a profecia é dirigida também a Maria: “Ele será ocasião de queda e de salvação para um grande número de pessoas, será um sinal de contradição, a fim de se revelarem os pensamentos íntimos de bons corações”. Esta palavra é dirigida também a Maria, mãe do Menino “Uma espada de dor trespassará a tua alma”
Quem é Simeão? É uma pessoa idosa, que vai ao encontro de Jesus no Templo da cidade santa de Jerusalém, porque o Espírito Santo lhe revelou que o Messias está a chegar. São Lucas informa-nos que Simeão era um homem “justo e piedoso” Lc.2,25).
Na Bíblia estas palavras indicam uma pessoa santa, fiel à Aliança, que observa as palavras do Senhor e sabe escolher o lado bom de todas as coisas.
Isabel e Zacarias eram também justos diante do Senhor, José, esposo de Maria, é chamado também “homem justo”. Simeão é uma das figuras que encarna a humanidade aberta às palavras da Lei e à vontade do Senhor, ele esperava a consolação de Israel, não estava triste por ser velho, não se deixava abater pelas dificuldades da vida, não era nostálgico nem melancólico, mas olhava para o futuro com uma grande esperança. Ele acreditava nos profetas de Israel, em Isaías quando escreve: “Consolai, consolai o meu povo...” Simeão não perdia a esperança.
Na realidade, um dos mais graves aspetos do nosso tempo, que nos deixa desolados e até inquietos na Europa, é a frustração das pessoas que se apresentam sem esperança, cujo fator principal são os difíceis problemas políticos, das guerras, até das bombas atómicas, problemas económicos e sociais, diminuição de população, lutas escondidas pelo poder. Pouco a pouco esqueceram-se os valores cristãos, o sagrado quase desapareceu, a família deixou quase de procriar, alastrou-se o aborto e defendeu-se a eutanásia, cresceu o consumismo, e os demógrafos avisam que se nada for feito nos fins do século XXI, já não haverá Europa, mas Eurásia.
Simeão não temia o futuro, o presente não era nada agradável, sob o poder de um rei vingativo e sanguinário como Herodes o Grande e, uma possível destruição de Jerusalém, como aconteceu no ano 70 pelo império romano, mas Simeão confia na consolação de Deus. São Lucas escreve “o Espírito Santo repousava sobre ele” (Lc.2,26).
Ele abria-se ao mistério e aos dons do Espírito Santo, aquilo que deveria acontecer a todo o batizado e crismado.
O Espírito Santo permitiu a Simeão falar a Maria, a Mãe do Menino Jesus, o ancião toma Jesus nos seus braços, reconhece n’Ele o Messias e louvou a Deus com um cântico de bênção, ele é o primeiro profeta do Novo Testamento. É um cântico esplêndido, cheio de luz, de glória, de total confiança em Deus.
Quais são as palavras dirigidas a Maria? O plano de Deus é luminoso, claro, transparente, mas tem uma mancha de sombra por causa da resistência dos homens. Simeão anunciou a profecia do amor divino que perdoa e salva, mas prevê também a resposta difícil dos homens, o sofrimento produzido pela recusa do plano de Deus salvador, para nos levar a compreender que nem tudo é fácil, que nem tudo tem aspetos positivos.
Simeão falou da glória de Israel, mas também da queda. O Menino que ele tem nos braços vai encontrar grandes resistências, ele obriga-nos a tomar uma decisão, Jesus divide a história humana, um sinal de contradição, será combatido em toda a sua vida, perseguido, preso, torturado, condenado à morte, mas Deus ressuscitou-O.
Simeão fala a Maria. Uma espada vai trespassar-te o coração. Maria vive o destino de Jesus, enquanto sua Mãe ela está solidária com as provas, as dores, os sofrimentos, de Jesus. Maria ainda sofre? O Papa São João Paulo II, na preparação do Jubileu do ano 2000, diz-nos que Maria nos revela o sofrimento de Deus diante das iniquidades humanas. Porque chorou Maria em La Salette e em Siracusa na Sicília? Que disse em Lourdes a Bernardete Soubirous e em Fátima aos três pastorinhos? porque no México, em Guadalupe, deixou a sua imagem na capa do pobre Juanito?
A Constituição pastoral Gaudium et Spes do Concílio Vaticano II, diz-nos estas famosas palavras: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, principalmente dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são puras alegrias e esperanças, tristezas e angústias dos discípulos de Cristo, e nada há de genuinamente humano que não encontre eco no seu coração.