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Artigo de Opinião

Médica Veterinária

3/08/2023 06:00

É sabido que a população em situação de rua é, lamentavelmente, marginalizada - além de estarem socialmente isolados são reiteradamente alvo de estigmas e discriminação. Fazem falta intervenções sociais de fundo e medidas políticas vigorosas capazes de responder à diversidade de necessidades desta população, em si mesma, heterogénea. Os animais de estimação, por exemplo, para estas pessoas podem funcionar não apenas como companhia ou "única família", mas também como um apoio emocional, com benefícios emocionais e terapêuticos. Muitas destas pessoas padecem de doenças mentais, como a depressão, e está mesmo descrito (por Kerman et al, 2020) que os sem abrigo que possuem animais de estimação têm menos sintomas depressivos que os que não os possuem. Estas pessoas tendem a desenvolver fortes apegos com os seus animais o que é gerador de evidentes benefícios psicossociais. A exemplo, os animais parecem constituir uma "forte razão para viver" e incita-os a outras atitudes como reduzir consumos aditivos ou a procurar cuidados de saúde. Os animais são tidos como a única fonte de estabilidade sócio-emocional, e de companheirismo, muitas vezes ausente na vida destas pessoas. São também, os animais, uma janela de oportunidade de "oferecer e ter amor incondicional" para mais no contexto de desabrigo das ruas... A própria responsabilização associada à detenção de animais é um amortecedor do stress diário, a que está sujeita esta população. Além da sensação de proteção e segurança que os animais lhes conferem. Ou seja, os animais são capazes de satisfazer muitas das necessidades humanas básicas à população sem-abrigo!

Pelo descrito, não se entende como é que muitas entidades (institucionais e sociais) apontam publicamente o dedo aos sem-abrigo com animais e criam mesmo barreiras que complicam esta experiência do vínculo e apego dos sem-abrigo com os seus animais de estimação - é o caso das políticas de muitos dos serviços que os abrigam e que proíbem animais de estimação, o que empurra ainda mais estas pessoas para errância das ruas, pois sentem-se coagidas a escolher entre os seus animais e o abrigos e cuidados (de higiene e saúde, por exemplo) de que necessitam. O mesmo ocorre quando querem obter uma moradia erguem-se barreiras pelas políticas dos mercados de aluguer de habitação - a esmagadora maioria não aceita animais.

Também não é incomum que estas pessoas sejam estigmatizadas por terem um animal de estimação sem um lar, inclusive por entidades defensoras dos animais e da sua adoção. A pouca empatia com estas pessoas talvez não lhes permita saber que muitas vezes, estas pessoas, se privam de cuidados e de alimento para si, para que estes não faltem aos seus animais.

Num tempo em que o modelo One health reemergiu com toda a força, sobretudo depois da pandemia, são necessárias mudanças na abordagem e intervenção nesta população, conhecendo e aproveitando a comprovada vinculação ser humano-animal para melhorar a saúde destas pessoas e para promover a sua integração social.

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