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Artigo de Opinião

Antropóloga / Investigadora

1/05/2021 08:03

Naquela quinta-feira de abril de 1974, o povo estava longe de prever o que estava por acontecer. Aparentava ser um dia como tantos outros, sem qualquer movimento fora do normal, à exceção das primeiras informações sobre a Revolução que chegavam de Lisboa. As notícias eram diversas, mas tudo encadeava para o mesmo sentido: um golpe de Estado, uma reestruturação política, uma ditadura de quase meio século que viria a ser derrubada!

As certezas do fim da ditadura iam sendo confirmadas pela população madeirense pela imprensa que informava ainda a vinda de Américo Tomás e Marcelo Caetano para a Madeira, sendo hospedados na residência civil do Palácio de São Lourenço.

Nos primeiros dias que sucederam a Revolução, vários grupos da oposição - como os Padres do Pombal e o Comércio do Funchal - reuniram-se com o intuito de preparar a majestosa manifestação do 1.º de maio. Os dias eram de apelo à adesão ao protesto.

A concentração estava marcada para as dez horas da manhã na Praça do Município, no Funchal. Mas naquela manhã do 1.º de maio, ninguém conseguia prever se a população viria à rua. Ainda pairavam memórias das antigas revoltas em que resultaram em mortes e detenções de muitos. Todavia, o povo respondeu à chamada. Grupos de manifestantes ocuparam o espaço. Chegavam de toda a Ilha e eram de todas as faixas etárias, desde os mais novos aos mais velhos. Representavam todos os extratos sociais. Trabalhadores, mulheres, jovens, estudantes, da direita à esquerda, saíram à rua para juntarem-se àquela que ainda hoje é conhecida como um marco na nossa Região.

O protesto ganhou força espontaneamente, levando ao nascimento de slogans, que ficaram para sempre na memória: "Não somos caixotes de lixo!" "O povo unido jamais será vencido!", "Marcelo Caetano, Américo Tomás, aqui não moram mais!"

De facto, a presença dos membros do Regime Ditatorial na Madeira, de figuras non grata, com uma estadia de luxo e de conforto, gerou uma revolta e um mal-estar, o que fortaleceu a união do povo madeirense. Mas o protesto contra estes inquilinos não era a única razão que levava as pessoas à rua. Exigiam, igualmente, um regime que desse ao povo condições de vida diferentes daquelas que tinham na altura, dizendo não às opressões ou às injustiças existentes. Tornou-se na maior manifestação de sempre na Madeira, em memória ao 25 de abril, aos ideais da Revolução, à liberdade, à democracia e ao dia do trabalhador.

Ninguém arrisca afirmar o número certo de participantes na manifestação do Funchal. Contudo, sabe-se que foram milhares, tendo sido considerada a maior de sempre das Ilhas Atlânticas.

47 anos depois, esta manifestação continua a ser conhecida como um marco histórico para todos os madeirenses. Orgulho-me deste povo que sofreu na pele os golpes da ditadura durante décadas, orgulho-me do povo português que não se deixou simplesmente render, orgulho-me destes heróis e revolucionários que lutaram por uma sociedade livre, democrata e autónoma!

A liberdade conquistada com o 25 de abril e 1.º de maio trazia para a maioria dos portugueses da Ilha, a vinda de outro sonho: o da autonomia.

Mas e agora? Como será o amanhã? O amanhã depende de nós! A nossa missão de não deixar cair no esquecimento a conquista da nossa democracia e autonomia; na luta pelos nossos direitos e igualdades; e na reivindicação por um futuro melhor… sonhar e querer mais!

Tal como diz a música Pedra Filosofal: "Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida…"

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