E nesta ocasião, a propósito da visita oficial de Lula da Silva a Portugal, escrevo sobre um dos pontos de agenda destas próximas semanas. Não estou a falar da entrega do prémio de Camões, ou da festa da flor a realizar-se aqui na nossa linda Ilha da Madeira, mas sim da visita do atual Presidente do Brasil ao Parlamento para discursar. As novas direitas ameaçam com boicote, anunciando protestos e manifestações de apoio à porta da Assembleia.
Posto isto, é legítimo ouvir Lula da Silva a discursar neste dia?
Ora, vamos por partes.
Primeiro, o que simboliza este dia? A Revolução de 25 de abril ligada a um evento da história de Portugal resultante do movimento político e social que depôs o regime ditatorial do Estado Novo, simboliza o fim de uma ditadura de quatro décadas, e o início da liberdade e da democracia.
Não vivi esta época de ditadura, nem vivenciei este momento glorio, mas orgulho de todos os portugueses que viveram e que lutaram por esta causa. Sem sombra de dúvida que este dia é e será sempre, de Portugal. É algo nosso, é o "nosso" dia!
Só por este simples motivo, vejo o convite de Lula da Silva ao nosso país, e ainda para discursar nesta data tão "nossa", como uma ideia ridícula, completamente disparatada. Nas vésperas da comemoração de um dia tão importante como este, é essencial recordar a causa pela qual foi a luta naquele dia. É importante honrar e agraciar aquilo que alcançámos com a Revolução de abril. É fundamental lembrar os capitães de abril - que já não estão cá hoje - que se uniram e lutaram por um futuro melhor. É crucial não acentuar disputas e contestações infundadas. Obviamente que um convite a Lula da Silva para participar nesta ocasião é atirar lenha para a fogueira. Como é do conhecimento geral, Lula tem um histórico complexo, associado a vários crimes graves de corrupção, julgados e confirmados pela justiça. Um indivíduo que proferiu declarações questionáveis, a todos os níveis, a propósito da guerra na Ucrânia. Uma figura altamente divisiva, tanto no Brasil como fora dele. Trazê-lo nesta data é acarretar para o nosso país essas divisões, gerando discórdia e revolta.
É esta a figura que os nossos Governantes convidaram para as comemorações de abril? Alguém associado à corrupção? Recordo que os ideais de abril não são unicamente a liberdade, a democracia e o fim de ditadura, mas também o não à corrupção. Aliás, a impunidade da corrupção e de crimes associados a lavagem de dinheiro são uma afronta àquilo que construímos que é a democracia! "Não se preocupem com o local onde sepultar o meu corpo. Preocupem-se é com aqueles que querem sepultar o que ajudei a construir", já dizia Salgueiro Maia.
Após o grande alarido à volta disto, eis que chegaram à conclusão que, afinal, Lula não irá discursar na sessão comemorativa do 25 de abril, mas sim numa receção prévia da mesma. Na minha opinião, uma estratégica manhosa para "calar" as protestações. Sejamos francos: mesmo que Lula não discurse na sessão, a sua associação a este tema será inevitável.
Não sabemos o que dirá Lula da Silva quando discursar na Assembleia da República de um país da União Europeia. Nem sabemos como irá reagir o povo no geral. No entanto, espero que este embaraço das comemorações do 25 de abril sirva de lição.
Daqui a uns anos, se fizer a história destes tempos, haverá com certeza quem se questione sobre como se cometeram tantos erros nesta época.
Alexandra Nepomuceno escreve à segunda-feira, de 4 em 4 semanas