A verdade é que nessa "busca" perecem, morrem, "nos braços de todos nós", pessoas migrantes, refugiados, que apenas pretendem alcançar esse "pedacinho da gente que sabe que vai dar certo". E estas mortes acontecem, porquanto, ao não ter existido a capacidade de se perceber que cada um deles é igual a cada um de nós em dignidade e que pode ser mais e melhor, permitimos que fossem "deixados à sua sorte" em embarcações que se tornam autênticas "salas de homicídio", sem qualquer sinal de humanidade e de misericórdia.
Entre março de 2020 e março de 2022, pelo menos, 27.464 pessoas foram abandonadas no mar, algumas delas crianças!
Efetivamente, e segundo o relatório "Democracy in Europe Movement 2025" (Movimento DIEM 25), as autoridades gregas efetuaram operações de "pushbacks" (devoluções) e de "draftbacks" (abandono dos requerentes de asilo), e com tais procedimentos, que são designados de "prevenções de entrada", muitos requerentes de asilo foram deixados em pequenos barcos insufláveis, sem coletes salva-vidas, sem água e sem alimento, tendo, ainda, sido identificadas situações em que a Guarda Costeira grega atirou pessoas para o mar, sem coletes salva-vidas e em que algumas foram encontradas com algemas.
Como é que tal se torna possível numa Europa que tão bem soube acolher a comunidade ucraniana? Será que existem pessoas de primeira e pessoas de segunda e que a cor, a cultura, a doença, a fragilidade constituem obstáculos ao acolhimento?
Recordo aqui a passagem da Carta aos Hebreus em que nos é dito "Não vos esqueceis da hospitalidade, pois através dela muitos, sem saber, acolheram anjos…".
Quantos de nós, quantos países e comunidades alcançaram que de tantas vezes que acolhem aquele que vem de fora, que é tão diferente de nós, acolhe um anjo que nos vai auxiliar no caminho do conhecimento, da experiência, do saber, da humildade, da perseverança. Pensemos na história do "nosso" campeão do mundo de triplo salto, Pedro Pablo Pichardo, e de tantos anónimos que tive a felicidade de conhecer, e que vão desde membros da comunidade do Uzbeque, a membros da comunidade da Guiné-Bissau, de Angola, de Moçambique, do Brasil, da China, do Paquistão…, com todos eles, com elas e com as crianças, aprendi! Ensinaram-me que do nada tudo pode ser transformado em "muito"…em "muito" de perseverança, de resiliência, de esperança, de fé, de Amor em que a "felicidade chega nos momentos de graça em que não se espera nada".
A Europa tem que lobrigar que não pode continuar a permitir os horrores que acontecem no Mar Mediterrâneo em que tantas crianças, homens e mulheres morrem por uma esperança. Devem ser concretizadas, com a maior brevidade, políticas de apoio aos países que acolhem migrantes e refugiados e estes devem sofrer as necessárias sanções quando se verificar que adotam procedimentos que constituem verdadeiros atentados aos direitos humanos dos migrantes e refugiados.
Recordemos o que nos disse Martha Nussbaum …"ser um bom ser humano é ter uma espécie de abertura para o mundo, uma capacidade de confiar em coisas incertas além do seu próprio controlo…", que os líderes europeus nunca percam esta capacidade de abertura para o mundo e de acolhimento ao outro, porquanto é aqui que reside sua riqueza e a possibilidade de transformação duma sociedade, de um Continente que é capaz de ultrapassar as procelas que vão surgindo neste mar da migração e dos refugiados.