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Artigo de Opinião

Presidente da Delegação Regional da Madeira da Ordem dos Psicólogos Portugueses

18/07/2024 08:00

Há cerca de um mês era notícia no Expresso que Portugal atingiu o valor mais alto de sempre de prescrição de antidepressivos - uma notícia que, na realidade, é sempre atual há mais de 20 anos. Na análise desta situação, podemos afirmar que há maior consciencialização para as questões de saúde mental e, consequentemente, procura pelos serviços (o que é verdade). Mas o facto de atingirmos sistematicamente recordes no consumo de um determinado tipo de medicamento e serem os cuidados primários que se destacam no aumento leva-nos ao debate sobre se tal se deve apenas a fatores favoráveis. E se sabemos bem que os fármacos têm um papel muito importante em quadros clínicos com determinadas características, também sabemos que não é uma panaceia ou a única opção para qualquer situação.

Num contributo para uma reflexão sobre este assunto, há dois aspetos que, entre outros, merecem ser considerados: um relacionado com o “tratamento” e outro com o que acontece antes das pessoas ficarem doentes. Desde logo, é importante questionar se a elevada prescrição se deve apenas ao aumento de consciencialização ou se também não existirá uma realidade em que os médicos de família não têm outras opções viáveis para as situações com que se deparam. Encontra-se amplamente demonstrada a eficácia da intervenção psicológica em múltiplas situações, por exemplo, de depressão e ansiedade. Mas se não existirem os psicólogos necessários no SNS, temos um problema de acesso a estas intervenções especializadas, nuns casos, bem como de acompanhamento atempado das pessoas, noutros. É também de discutir os melhores modelos de intervenção e encaminhamento para lidar com as diferentes situações com que os serviços se confrontam. Esperemos que os passos que têm sido anunciados no sentido do reforço destas capacidades se concretizem.

Temos também de falar sobre o que é que acontece antes de as pessoas chegarem aos serviços de saúde. E um problema comum na área da saúde mental é que do que se está a falar, na realidade, é de doença mental. Isto não é um pormenor ou uma questão de semântica. Traduz-se na menor atenção aos fatores que contam e na (des)valorização do que é importante fazer antes que a doença se instale.

Se a prevalência de perturbações psicológicas e o consumo de medicamentos são o que são, tal convoca-nos para pensar não apenas no tratamento, mas na prevenção. E a prevenção da doença não começa no consultório. O que é que se passa na vida das pessoas e da comunidade em geral que poderá contribuir para essa situação, isto é, o que é que ocorre antes de as pessoas acederem aos serviços de saúde? Por exemplo, que questões laborais, socioeconómicas, ambientais, relacionais, familiares, de hábitos de vida, poderão contribuir para isto? Como é que trabalhamos e que intervenção existe sobre os riscos psicossociais nos locais de trabalho? Que equilíbrio existe entre as diferentes esferas da vida individual? Que hábitos de exercício físico, contacto com a natureza e lazer existem? Que parentalidade é exercida? Que interações sociais temos, incluindo o que se passa online? Que indicadores de igualdade e coesão social existem? Enfim, como é a vida individual e comum, e em que medida isso é um fator central no surgimento e na manutenção de problemas de saúde, requerendo por isso uma ação objetiva nas respetivas áreas. Numa época em que se fala tanto de saúde mental, seria proveitoso que a ação começasse a focar a saúde - e não apenas a doença -, com tudo o que isso significa.

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