A propósito da questão, li uma história infantil em que uma população (no caso eram animais) trabalhava arduamente para se precaver contra os rigores do inverno. Mas um dos elementos, um artista tido como preguiçoso, só escrevia, dançava, lia, compunha, pintava sem se importar com o inverno. Chegada a esta estação todos estavam seguros e tinham mantimentos para sobreviver, menos o "artista". Mas também estavam todos entristecidos e foi então que o artista lhes trouxe alegria com as suas cantorias, declamação de poemas e coreografias. Não lhes chegava o pão, precisavam de diversão para o espírito e para suportar melhor a agrura dos dias. E esta história pode bem elucidar a importância da arte, da poesia, na nossa sociedade. Como um "pilar de humanidade". A maioria da população agiu racionalmente, mas foi no reino das emoções que encontraram conforto e alento.
A poesia é emocional e não racional e não se subjuga a orientações pragmáticas ou científicas, mas tal como a ciência intervém na formação do indivíduo, pela expressão de valores humanos, de experiências, vinculando-nos uns aos outros. A poesia continua a assumir um lugar de honra na literatura e na sociedade, sendo-lhe parte integrante. Tal como outros agentes sociais, os poetas têm um papel educador pelo seu legado cultural capaz de moldar indivíduos e sociedades - "a poesia pode ser uma arma como a cantiga".
Quem imaginaria uma sociedade sem poetas - artesãos da "expressão do belo por meio de palavras artisticamente alinhavadas" (Jorge Luís Borges) e que reunificam e compartilham símbolos humanos e humanitários, como o bem e o mal? A poesia tem o poder de despertar e de criar beleza, através de caminhos que sensibilidade, mas também de memórias e imaginação. Não tem o propósito, como assinalou Paul Valery, de "comunicar pensamentos, mas sim de dar à luz estados emocionais" que se encontram no outro, no seu semelhante. A poesia tem um valor inestimável, é provocadora e remexe toda a organização instaurada, até porque potencia a competência da leitura critica e interpretativa capaz de rebater a lógica e de assimilar uma linguagem criativa repleta de símbolos e sentidos. Ou seja, é capaz de recriar o mundo nem sempre poético, num mundo poético, por isso é recomendável que se ensine e fomente a poesia em espaços como escolas e universidades que são espaços políticos e sociais e onde a ética, o belo e os valores humanos devem ser ministrados sobre todas as formas. E no caso, concreto da poesia, esta pode ampliar o leque de critica aos valores vigentes ao transcender o que é real e palpável, e fomentar a comunicação por emoções e sentidos ao permitir, por exemplo, que o leitor se reconheça com um poema e se reveja num sentimento de compartilha e comunhão. Faz falta a recriação e a ressignificação do mundo e a poesia pode ser essa centelha de mudança que se quer... afinal, tem sido sobretudo a poesia que ao longo dos milénios tem expressado o amor, marcando-se pela subjectividade e pela busca da beleza nem sempre com recurso às palavras. A poesia comunica-se por poemas, sim, mas esta não é a única forma de expressão da poesia - também se expressa na música, na pintura, no teatro, e noutros exemplos de experiências sensoriais e abstratas de produção artística.