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Artigo de Opinião

3/01/2023 08:00

Um dos preceitos desta secular fé é o de que a colectivização forçada da solidariedade, ou seja, a redistribuição de resultados (proveitos económicos obtidos da exploração dos talentos próprios), a maior parte das vezes bem-intencionada, sem dúvida, produz indivíduos mais solidários e empáticos para com o seu semelhante.

Analisemos um caso em concreto (que coisa horrível!): uma vez vinha em conversa, pela rua, com um orgulhoso crente da fé, truculentamente militante, quando fomos abordados por um senhor de idade, bastante magro. Pedia-nos, o senhor, uma ajuda para comprar um medicamento para o qual não tinha disponível, no momento, o valor total. O crente que me acompanhava recusou-se, de imediato, a ajudar. Foi bastante exuberante na sua explicação de que já pagava impostos para que o senhor pudesse ter ajuda. Já tinha feito a sua parte, por isso a mais não podia ser obrigado. Ninguém pretendia obrigá-lo a nada, diga-se.

Passando do particular para o geral, parece-me lógico que essa solidariedade forçada pelo Estado, feita pelo Estado e sempre através do Estado, separe o indivíduo que pode ajudar daquele que precisa de ajuda. A empatia deixa de ser necessária, uma vez que o indivíduo não sabe, nem precisa de saber, quem necessita, do que necessita, ou porque necessita; não tem oportunidade para se pôr nos sapatos dos outros; ou seja, para sentir empatia. Além disso, o financiamento é feito de forma involuntária, pela força, sem ter em conta a vontade de quem contribui, criando — na melhor das hipóteses — indiferença, ou até mesmo ressentimento. Fica a criação de empatia a cargo da comunicação social, com o viés que cada uma das redacções lhe quiser dar (exacerbar, amenizar, desvalorizar), retirando importância aos laços sociais próximos. A consequência é a de se acabar por promover, no fundo, a indiferença. Quem paga impostos não sabe quem beneficia da solidariedade, nem precisa de saber. Quem paga impostos sente que já fez a sua parte e está, por isso, dispensado de ser empático ou sequer socialmente responsável — indiferença, mais uma vez. Basta-lhe ser legalmente cumpridor, portar-se bem, na parca esperança de manter o braço judicial do Estado à distância.

Ainda me lembro das declarações de uma certa dirigente política, responsável por um dos partidos portugueses que mais prega a secular fé, atacar o trabalho do Banco Alimentar Contra a Fome com o epíteto de "caridadezinha", acompanhado de uma cara de nojo. Como são indivíduos, de sua própria vontade, a ceder aquilo que podem e querem a uma entidade privada, para que esta faça aquilo que aquela senhora considera que só Estado pode fazer, está errado. Quem tem de prover pelos indivíduos é o Estado, nunca os próprios indivíduos. A empatia deve existir apenas na hora de aceitar entregar o trabalho ao Estado, para que este o distribua e faça o seu papel eclesiástico. Ao indivíduo cabe obedecer.

A solidariedade, na verdadeira acepção da palavra (voluntária, empática, criadora de laços entre indivíduos), nos dias que correm, é um radical acto de rebeldia.

Sejamos rebeldes neste ano que agora começa.

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