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Artigo de Opinião

Professora Universitária

8/01/2024 08:00

A decisão de Marcelo Rebelo de Sousa de dissolver a Assembleia da República ficará para a história de Portugal como o culminar de um processo de desgaste da maioria absoluta começado logo no dia a seguir às eleições, logo no dia a seguir ao momento em que os cidadãos portugueses tinham dado um voto de confiança ao Partido Socialista para governar o país. O Presidente da República correu, correu e deu, num momento de vitória, a taça de vencedor à direita e à extrema direita. A dissolução ficará para a história futura como um caso sui generis, em que a Assembleia da República é dissolvida pelo Presidente tendo como justificação a demissão do Primeiro-Ministro, sem ter em conta que o eleitorado elegeu um partido, uma ideologia, um posicionamento político face ao país, um programa e um projeto.

Tomada muito antes do Conselho de Estado, que só acabou empatado pela saída de Lídia Jorge, obrigada a cumprir presença na cerimónia da sua própria premiação (compromisso conhecido e que deveria ter sido em conta para que todos pudessem votar), a decisão ficará para a história como exemplo de desestabilização entre poderes. Será ainda mais grave, se ficar ligada a uma instabilidade que provoque graves consequências na situação socioeconómica do país e ao crescimento de movimentos antidemocráticos tentaculares que minam por dentro, neste momento, a sociedade portuguesa. Arrisca-se, por isso, o Presidente da República a uma futura revisão da história pouco complacente com o presidente dos afetos.

Foi por isso tão importante que o Congresso Nacional do Partido Socialista, o 24º dos seus cinquenta anos de existência, tivesse olhado para o passado que não passa, pensando, como disse um dos congressistas, no futuro que não espera. Como verdadeiro partido social e democrata que é, compromete-se, em união e com entusiasmo, com o Estado social e em ser ativo na condição da afirmação da dignidade humana, opondo-se ao perigo dos radicalismos e de uma separação entre a população e a política, terreno fértil para a destruição da democracia.

Não se enganem as pessoas: vivemos anos fatais, com uma ameaça real às conquistas culturais realizadas a partir da segunda guerra mundial e um desprezo, sempre menos envergonhado, em relação ao valor atribuído a tudo o que deveria ser defendido a todo o custo. O homem consciente está alerta para o facto de que a mentira tem vindo a ser sistematicamente elevada à dignidade de instrumento político e que a segurança nos valores humanos pode não sair intacta de um processo que fere os sistemas vitais das comunidades humanas, a educação, a saúde e a previdência.

O Partido Socialista apresentou um projeto de ambição de crescimento económico, aliado ao aumento da produtividade, apostando na educação, no desenvolvimento económico e tecnológico, na preservação ambiental. Assumiu esse projeto sem deixar para trás ninguém – as crianças, os jovens, os mais velhos, os mais pobres, todos os que se encontram de alguma forma fora do circuito de produção direta de riqueza económica. Sabe que o esforço contributivo é válido, porque permite uma educação e saúde para todos, pagamento de reformas e ação social para quem necessite. Parte da ideia de que independentemente do ambiente em que se nasce, da região em que se estuda, do lugar onde se vive, todos devem ter iguais oportunidades numa sociedade em que o aumento dos rendimentos é condição fundamental do bem-estar coletivo e que o esforço comum enriquece o país.

A dissolução desnecessária da Assembleia será julgada pela história futura, mas tem efeitos no presente e no futuro próximo que podem ou alavancar uma nova fase de progresso ou ser coveiros da democracia. O “farol da Europa”, como é designado Portugal na Europa, pela demonstrada capacidade de unir o desenvolvimento económico com as políticas sociais, não pode apagar-se e deve poder continuar a mostrar que não são os cortes na educação, no trabalho, nas reformas, na saúde que fazem um país rico. Um país é rico quando é verdadeiramente social e democrata, isto é, socialista na sua perspetiva de missão na comunidade.

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