Recentemente, foi tornada pública uma nova auditoria do TdC visando as Áreas Protegidas, cujo relatório (n.º 22/2022) foi claro a indicar que metade das áreas naturais classificadas da Região Autónoma da Madeira não possuem o respetivo plano de gestão. Diz o auditor que, das 73 áreas protegidas, apenas 26 áreas possuem planos "implementados", ao contrário dos Açores onde todas as suas 200 áreas protegidas estão salvaguardadas.
Mas foi mais além quando é referido neste relatório que "para além de falta de clareza de objetivos e metas e de falta de gestão proativa no terreno, a gestão das áreas protegidas não tem sido eficaz, designadamente do ponto de vista da defesa e promoção de valores naturais e culturais".
Curiosamente, este relatório é publicado poucos dias antes de uma conferência sobre as Ilhas Selvagens, um evento organizado pela Presidência do Governo Regional e pelo IFCN, que contou com a presença de vários representantes nacionais e internacionais, incluindo o enviado especial do secretário-geral da ONU para os Oceanos, a ministra da Defesa e o secretário de Estado do Mar.
Certamente que a auditoria foi um dos principais impulsionadores da decisão de NÃO SEREM CONVIDADOS elementos dos partidos da oposição para debater com os representantes internacionais os importantes temas relativos à maior Área Marinha Protegida do Atlântico Norte.
Era importante "pôr água na fervura" e a incómoda presença da oposição poderia revelar ainda mais fragilidades. O Governo optou, então, por mostrar apenas a propaganda política do costume aos seus ilustres convidados.
Ainda assim, tal postura não evitou alguns momentos de brilhantismo de Peter Thomson alertando para "a urgência de proteger os oceanos" referindo a necessidade de "um trabalho em conexão entre todos". Uma clara alfinetada ao Governo deste enviado especial da ONU que, certamente conhecedor dos relatórios da UNESCO e da IUCN que criticavam profundamente as más opções políticas e a postura prepotente e autoritária do Governo, aproveitou para lançar esta pequena farpa.
Infelizmente, este ensinamento não foi bem acolhido por todos, e, ainda há dias, tive a oportunidade de ler um artigo opinativo-propagandístico, cujo autor, na sua "elegância" habitual, apelida de "profetas da desgraça" todos aqueles que ousam opinar e pensar diferentemente dos que, julgando-se os únicos especialistas, mantêm a letargia da governabilidade ambiental.
Aparentemente mantêm a ideia de que todos os que defendem o ambiente terão de se deixar enamorar pelos resultados (ainda que medíocres) conseguidos pelos doutos especialistas político-partidários que tudo sabem, mas pouco concretizam (com algumas honrosas exceções que sabem bem que o são).
Sem qualquer laivo de ironia, acredito que seja complicado manobrar um barco desgovernado quando o comandante manda retirar os remos, mas apesar de muitos daqueles que se sentam em cadeiras governativas acharem que a "democracia é uma chatice", é necessário que entendam que toda e qualquer medida política, por muito justificada e benéfica que seja, pode ser alvo de melhorias e deve ser alvo de discussão e, sobretudo, de escrutínio governativo daqueles que foram (legitimamente) eleitos pela população.
Tal altivez destes "Senhores e Senhoras da razão e da verdade" traz à memória a personagem da mitologia grega Cassandra, que, tendo obtido a capacidade da visão, via as desgraças que se aproximavam, alertava para o facto, mas ninguém lhe dava ouvidos, tornando-se a mais famosa "profetisa da desgraça". A falta de confiança nos alertas de Cassandra levou à queda e consequente destruição de Troia.
Com a atual inércia que decorre talvez fosse sensato uma maior humildade em escutar os tais alertas. Principalmente quando os problemas levantados são reais, sérios e merecedores daquilo que mais tem faltado a esta governação... ação!