As últimas semanas ficaram profundamente manchadas pelo maior furacão político e judicial dos últimos anos na Região e o maior golpe político para o PSD-Madeira nos últimos 50 anos.
Depois de uma primeira tempestade que chegou com as declarações de Sérgio Marques e a sua denúncia sobre “obras inventadas” e a alegada influência de grupos económicos sobre o Governo Regional da Madeira, esperava-se, do partido que governa a Região há mais de 5 décadas, um ato de dignidade perante estas situações que levaram à constituição de Miguel Albuquerque como arguido numa mega investigação que levanta factos suscetíveis de consubstanciar diversos crimes, incluindo corrupção e suspeita de controlo da comunicação social privada para condicionar as notícias desfavoráveis ao governo.
Acusações graves que deveriam levar a um esclarecimento cabal à população e à Assembleia Regional, mas rapidamente percebemos a tática evasiva social-democrata: à justiça o que é da justiça, à política... o silêncio.
Não podemos proibir à política a apreciação de factos e comportamentos, única e exclusivamente porque estão sob apreciação judicial. Não podemos admitir que o silêncio seja novamente o salvo-conduto político para um suspeito de uma pendência judicial. Não podemos amordaçar o juízo da responsabilidade política, sob risco de estarmos a premiar politicamente os comportamentos politicamente inaceitáveis.
Mas uma vez mais, o silêncio tem sido o tom seguido pelas principais figuras políticas do PSD-Madeira. Não se sabe se por cobardia ou por vergonha, o certo é que pela primeira vez na história política da “Renovação”, assistiu-se, no Parlamento Regional, a um PSD fragilizado, atropelado, completamente desnorteado, a se recusar a usar da palavra no tempo de intervenção que os seus deputados têm para intervenções políticas na Assembleia Regional. Uma autêntica política de avestruz... nem um pio por parte da bancada da maioria sobre esta crise que neste momento preocupa e inquieta os milhares de madeirenses que assistem com descrédito e revolta a este circo mediático.
A verdade é que perante um cenário de completa trapalhada, entre requerimentos de renúncia que andam para trás e para a frente, anúncios de substitutos que afinal já não o são, de aprovações do Orçamento e Plano para 2024, que afinal foram deliberadamente adiados para satisfazer interesses partidários da maioria que suporta o Governo (e que obriga a uma indesejável governação em duodécimos), criou-se artificialmente um clima de medo e de instabilidade por um partido que, perdendo a primeira maioria parlamentar da sua história em 2019, e repetindo a façanha já com uma coligação em 2023, sabe bem o que o futuro lhe reserva.
Só o medo do voto popular justifica o receio de Albuquerque em seguir os passos de Jardim que, em 2007, colocou-se a si e ao PSD ao escrutínio do Povo para uma relegitimação democrática.
Estamos perante uma completa balbúrdia que só aumenta a desconfiança dos cidadãos e a descrença no sistema político tradicional, interpretando-o como um jogo onde diversas personagens continuam empenhadas no objetivo primeiro de exercerem e manterem o poder em prol dos seus interesses pessoais e, em última análise, dos interesses partidários.
No momento em que escrevo este artigo, ainda não é conhecida a posição do Representante da República, cujas declarações estão previstas para sábado à tarde, mas é legítimo pensar que a indigitação de um novo executivo, e por inerência a discussão de um novo programa de Governo, só poderá ocorrer se existir a legitimação pelo sufrágio popular. Face aos graves indícios de corrupção da teia governamental, é obrigação dos detentores de cargos eleitos ouvir o Povo, e os madeirenses desejam que a palavra lhes seja dada em eleições.
Estamos perante uma profunda crise de credibilidade e uma crescente falta de confiança nas instituições, sobretudo entre os jovens. E uma coisa é certa: a recente libertação do ex-presidente da Câmara do Funchal e dos gestores do Grupo AFA e Socicorreia, Avelino Farinha e Custódio Correia, ao fim de 21 dias de detenção, não pôs fim à crise política na Madeira, e só veio agravar uma ainda mais profunda perda da imagem de credibilidade, competência e confiança dos cidadãos no sistema político, mas também no sistema judicial e, em particular, na qualidade do trabalho do Ministério Público.