Há cada vez menos tolerância, há cada vez menos empatia, há cada vez mais conflitualidade.
Quantas e quantas vezes me dizem, por que motivo fazes isso se ninguém o faria por ti, estás a ser "tontinha"…!
Faço-o de coração preso ao coração do próximo, por considerar que é ali que estão a precisar de mim, por saber que aquela pessoa sofrerá menos com aquela palavra, com aquele conselho…, com a minha presença…, é difícil? Não é fácil…, mas quando amamos a vida, os outros, a nossa profissão, sacrificamo-nos, damo-nos por todos eles, colocando, mais uma vez, o "nós" diante do "eu".
Aprendi que são as dificuldades que nos capacitam para viver os momentos de triunfo com tremenda humildade, aquela que percebe que tudo é efémero e que o mais valioso que temos são os momentos da vida, feitos de gestos e de pessoas tão simples, que nos ensinam a apreciar a alegria da criança, o sorriso do idoso, a delicadeza do outro.
Carl Gustav Jung diz-nos que "o importante não é ser perfeito, é ser inteiro", e é esta inteireza, que nos faz tanta falta, que percebe que a riqueza, o brilho de cada um de nós, advém do tempo que dedicamos ao próximo, pois nele nos acendemos. E neste tempo, mais do que quantidade, impõe-se a qualidade. Quantas vezes numa casa, no seio de uma família, todos estão juntos e tão afastados, … os filhos fecham-se nos quartos, os pais dedicam-se aos jogos ou a ver televisão, não acontecendo conversas, partilhas de histórias de vida, de livros, de viagens.
E com tudo isto custa-me tanto verificar que, no mais recente estudo do "Health Behaviour in School-aged Children", realizado pela Organização Mundial de Saúde em 51 países, em Portugal, e numa amostra de quase seis mil alunos (do 5.º, 8.º e 10.º anos), 27,7% dizem sentir-se infelizes, representando, praticamente, o dobro de 2014 e acima dos 18% registados há quatro anos.
Efetivamente, temos mais adolescentes com sentimentos de tristeza, nervosismo e medo, aumentando os problemas de sono, bem como a toma de ansiolíticos e antidepressivos. E um em cada quatro já admitiu a automutilação, por intermédio de cortes, queimaduras ou outras lesões.
Os nossos jovens estão mais dependentes das redes sociais e muitos admitem usar a internet como forma de aliviar a angústia.
A tudo isto não é alheio o choque da pandemia, dos confinamentos, do encerramento das escolas, bem como as separações dos progenitores.
Olhando para os processos de regulação das responsabilidades parentais, que tenho acompanhado, constato que os pais desavindos, perdidos nas suas dores, não conseguem alcançar que os filhos não são propriedade um ou de outro, antes resultam de um bonito projeto que deu à luz aquele fruto que tanto os ama, não obstante a separação, o divórcio. E estes filhos não gostam nada de ouvir a mãe fazer queixas do pai e o pai da mãe…, com tantas queixas e azedumes ficam tristes, angustiados, preocupados, chegando, muitas vezes, a sentirem-se culpados.
Estas crianças, estes jovens, serão os nossos políticos do amanhã e gostava tanto que soubessem que é tão importante conversar, olhar para o outro, passear, que ninguém é perfeito, pelo que não há que endeusar o corpo ou maltratá-lo, que a vida tem dissabores e que são estes que nos capacitam para enfrentar as dificuldades, verdeiros processos de aprendizagem!
Tenhamos, peço-vos, confiança e que "percamos o medo aos sucessivos nascimentos que se abrem para cada um de vós, para cada um de nós".