Cruzo as pernas, jogo-me para o chão e contemplo o que me aparece à frente. Sinto o cheiro a pólvora, vejo ao longe o caos. Carros, caixotes do lixo incendiados. Patrulhas de polícia pela rua, bombeiros a apagar fogos, socorristas a sarar feridas.
Observo inocências perdidas, crianças influenciadas por adultos revoltados pela diferença. O ódio alimentado de tenra idade, e a inocência.
Inspiro o cheiro a queimado a percorrer o rastilho, alimentado pelo quinto cavaleiro do apocalipse.
Vejo os lagos a desaparecerem, os rios a diminuírem, e as flores a morrerem. Observo do alto do monte de onde me sento, preso por correntes, por cobardia.
Duas facções se aproximam, duas verdades corroem os homens, liderados por capitães, majores, coronéis e generais.
A fome cresce, sedente de vingança e aniquilação. Aumenta a fadiga e diminui a esperança, as árvores ficam sem ramos, os pássaros, sem poiso, começam a tombar. A morte instala-se.
Eu mantenho-me acorrentado, resignado, pelas normas de uma sociedade decadente, por um povo que já não se tolera, nunca se tolerou.
O alimento é formado por desespero, e nós alimentamo-nos procurando um teto, procurando uma saída do gueto que está a nos devorar.
A paz que procuramos virá com o tempo, mas esse tempo virá por nós. E o tempo já se esgota.
Os cavaleiros já se juntam, a chamada já está perto.
As cadeias encontram-se esgotadas, as pessoas ficam na rua, mas todos nos escondemos e somos todos cruéis. Não há falta de tiranos, não há falta de tolos. E o tempo continua.
As sirenes confundem-se. O mundo fica cada vez mais plano, ficando fácil para os cavalos passarem.
Ezequiel e Zacarias previram, e neste momento só estou à espera. Aguardo pelo fim do rastilho, aguardo pelo tempo.
Um padre, corre, procurando a sua salvação. Ninguém se ajoelha, ninguém implora, carregando o ódio, ele foge.
O sol arde na pele, que começa a formar as bolhas, as bolhas da vergonha, tentam esconder-se na floresta, mas a mesma começa a escassear. Reduziu-se a cinzas, que são espalhadas pelas ruas, por entre os canteiros abandonados,
Não há nada mais valioso para proteger, a inocência foi roubada, a terra secou, o verde desapareceu e o azul morreu.
E continuo sentado em cima do barril de pólvora que chamo de mundo. A observar o rastilho a chegar ao fim, e o quinto cavaleiro a pedir para ter fé, acreditar cegamente, fechar os olhos e não questionar.