Todos nós temos medos! Aqueles que dizem que não têm medos, mentem! Todos temos medo de perder os nossos filhos, outros de perder as suas vidas, outros de ir para a guerra, outros de alguns animais. Aqueles que digam que não têm medo, mentem! Mentem!
Qual é o teu medo?
Já o meu medo é um dia voltar a ser criança. Quer dizer, não é bem ser criança, é algo que me assusta… Vamos imaginar que hoje você é acordado às 7 da manhã, vão dar-lhe um banho, vestir-lhe uma roupa aleatória sem qualquer tipo de pandã. Posteriormente, sentar numa cadeira de rodas, preso com uma mesa de plástico à frente, tomar um pequeno-almoço que nunca comeria há uns anos, e ser conduzido até a uma sala e ficar ao pé de desconhecidos, ouvindo programas de TV de um qualquer apresentador esquizofrénico, mas olhando para o vazio. Pensando, mais devagar, é óbvio: onde estão aqueles que criei, aqueles por quem me sacrifiquei? O almoço segue-se, comer algo de que não tive opinião ou qualquer tipo de escolha, é aquilo e pronto. À tarde, repete-se a manhã… Depois vem um jantar e é colocado numa cama, num quarto que não é o seu, não foi para este que trabalhou.
Há dias diferentes, é verdade, há quem diga que são atividades adequadas ou dinamizações fantásticas, pois todos adoram isto. Danças? Nunca dançaria, mas aqui tem que dançar para ser ativo, desfilará com um chapéu ou um fato qualquer ridículo, algo que nunca faria, mas haverá alguém que exclama: "que feliz que ele está aqui…".
Até que chega um dia… Esse dia que nos esquecem na cama, dizem que não lhe apetecia levantar, mas a realidade é que estava a dar muito trabalho, pois a mobilidade é pouca e está esquecido ou demente, só fala de coisas antigas… Fica na cama… Morre ali, num local desconhecido, num local vazio de amor, num local impessoal, onde é o local de trabalho de todos, mas que não é de ninguém.
Como é óbvio, esta não será a realidade de todos… Outros ficam doentes e ficam logo na cama, numa cama de um qualquer hospital, onde se espera que volte ao que era. Dizem que está com alta clínica, mas para a família não é o que era. É um ser humano sem futuro, é um ser humano sem amanhã… É como um bebé, mas enquanto o bebé desperta para a vida, um idoso adormece para a morte, ambos são idênticos, mas o futuro é diferente.
Existe, de acordo com os dados recentes, quase 100 doentes na Madeira com alta clínica, não é um problema da saúde, não é um problema da segurança social, não é um problema das famílias, é um problema da Região, é um problema de todos! Não nos podemos demitir de sermos humanos! Fechamos escolas, ou melhor fundimos, pois deixam de existir crianças, mas não criamos condições para que idosos tenham possibilidade de ficar em suas casas. Não se pode gastar 10 milhões em túneis para água de rega, mas demitimo-nos dos nossos ascendentes.
Sabem, o meu medo é que, de acordo com a média, passarei 1/3 da minha vida como idoso, sendo que essa longevidade de vida, vem acompanhada com demência, perda de visão, perda de audição, no qual uma em cada cinco pessoas terá uma qualquer demência após os 80 anos. De acordo com os dados da Eurostat em 2014, mais de 50% da população idosa tem dificuldades numa atividade pessoal, seja tomar banho, comer ou estar sozinho.
A experiência de ser idoso é difícil de imaginar, muitos já assistiram a um familiar, queríamos ter feito mais, mas sentimo-nos sem capacidade para o fazer! Sentimo-nos impotentes, com o coração partido, sem saber como ajudar aqueles que tudo fizeram por nós, um sentimento de culpa por não termos recursos para que se possa cuidar da mesma forma como nos cuidaram.
Quando o nosso filho de 3 anos está connosco num parque e nos pergunta 21 vezes sem conta o que está à nossa frente, isto é, somos capazes de responder com todo o amor: é um pássaro. Mas será da mesma forma quando um pai ou uma mãe nos questiona da mesma forma?! Podem ter paciência e tempo para nos ensinar o que aprenderam connosco? É bom pensar que sim!