O tema desta semana relaciona-se com a verdade e o engano / mentira, numa perspetiva social e evolucionária darwiniana. É muito interessante ouvir algumas frases populares, como “quem diz a verdade não merece castigo” ou “a mentira tem perna curta”. Estes ditados populares surgem como uma necessidade de incutir a importância da verdade.
Parece-me interessante considerarmos que a mentira e o engano são favorecidos pela evolução. De tal forma, que surgiram técnicas biológicas para o fazer, como a camuflagem. O engano entre predador e presa, serve tantas vezes para evitar ser capturado, como para surpreender e capturar a presa. Na sociedade humana, na forma de jogos infantis, treinamos a surpresa e a camuflagem, com o mesmo propósito, a obtenção de uma vantagem.
Assim, na evolução humana, passámos de solitários indivíduos, a pequenos grupos, a grupos maiores e atualmente a grupos enormes. Estamos no auge da liberdade de expressão e um dos problemas atuais são as mensagens falsas, como as tentativas de roubar as pessoas e de transmitir informação falsa para direcionar intenções de voto. Temos assim de considerar a possibilidade de a mentira e o engano serem capacidades promotoras da sobrevivência do indivíduo. E é fácil de perceber porquê...
O problema da existência da mentira não é para o indivíduo, mas para toda a sociedade. Se a mentira e o engano podem promover o sucesso individual, a sua prática generalizada pode conduzir ao colapso da sociedade, através da quebra da confiança social. Este é um tema que no pós-eleições-quase-novas-eleições é fundamental refletirmos. A política representa o píncaro da vida pública e deveria estar repleta dos melhores exemplos da nossa sociedade. Infelizmente e a crer nas notícias e informações divulgadas nos últimos 10 anos, é possível que a mentira seja algo demasiado frequente.
Desta forma a frase “quem diz a verdade não merece castigo” é sentida por muitas pessoas que “quem diz a verdade é castigado”. E o castigo vem pela hierarquia da sua posição social (como os militares que foram suspensos por se recusarem a sair com um navio, para poucos dias depois ele ter uma avaria grave; bem como os políticos que foram expulsos do seu posto por terem perdido a “confiança política”, como tantos outros casos de onde vem a conhecida expressão de ficar “na prateleira”).
Como podemos conduzir a sociedade para um bom porto, se temos este grande dilema por resolver? Sem integridade e verdade destruímos a confiança uns nos outros e deixa de ser possível realizar negócios, encontrar justiça e segurança. No entanto, numa sociedade cada vez mais individualista em que a procura do prazer do momento, do dinheiro sem esforço, do poder e sucesso sem sacrifício, são os principais motores, como podemos acreditar que será possível termos a valorização da verdade?
A verdade é um bem do grupo e a mentira um bem do indivíduo. Se queremos diminuir os conflitos e aumentar a coesão, diminuir a guerra e aumentar a paz, temos de agir em verdade e assumir quando falhamos. Curioso, como a escolha individual pode significar a sobrevivência do grupo. Queixamo-nos da corrupção e votamos em suspeitos e já julgados por corrupção. Queixamo-nos da crise na habitação e favorecemos os turistas nos alojamentos locais. Os alojamentos locais facilitaram o turismo ao baixar os custos do alojamento, mas a consequência foi que os locais ficaram sem lugar para viver. Mais vale ir de férias do que ter casa? Que humanidade tão curiosa.