O título deste artigo corresponde ao slogan do Washington Post. Contudo, posso acrescentar que a democracia também morre à luz do dia, perante todos os nossos olhares e perante a nossa passividade.
Vou referir-me à crise instalada em vários órgãos de comunicação social (CS), detidos pela Global Media Group, que envolvem alguns dos títulos mais emblemáticos do jornalismo português: “Diário de Notícias”, “Jornal de Notícias”, “Açoriano Oriental”, TSF e outros, bem como a desafios que se colocam ao próprio jornalismo.
Com as redes e as plataformas digitais instituiu-se a ideia de que a CS deveria ser gratuita, gerando uma crise do modelo de negócio jornalístico. O facto de muitas pessoas não quererem pagar para terem acesso a informação credível e de qualidade, a par da diminuição dos contratos com a publicidade e do aumento da desinformação intencional tem minado a viabilidade financeira dos projetos jornalísticos e trouxe o financiamento de grupos económicos para esta área.
Este modelo de negócio tem tornado visível que a liberdade de imprensa começa a estar condicionada. Jornalistas precários, baixos salários, redações com poucos profissionais para muito trabalho, cortes financeiros para a concretização do produto jornalístico implicam o quase desaparecimento das reportagens ou do jornalismo de investigação, que é um instrumento credível para o escrutínio em sociedades democráticas. Quando ouvimos jornalistas a falar ou escrever sobre a sua profissão, percebemos que a ideia que já percecionamos corresponde à realidade:
- quem está nas redações só tem tempo para trabalhar os comunicados enviados pelos gabinetes de comunicação das diversas entidades, dando-lhes uma “roupagem” jornalística, ou nem sequer alterando nada, pois o trabalho é demasiado e o tempo escasseia;
- as redações ficam esvaziadas de profissionais que são contratados por gabinetes de comunicação e que apostam na construção de narrativas políticas que lhes interessam;
- há grupos de pressão que acabam por conseguir o surgimento de um jornalismo permeável a interesses políticos ou económicos;
- jornalistas sem tempo para pensar, para o rigor ou até para a qualidade, respondendo ao imediato e podendo cair na tentação de seguir os interesses de quem lhes paga.
Esta transformação tem acontecido com a conivência de grupos económicos, governos, jornalistas e de cada um de nós. Quando partilhamos notícias que só de acesso a assinantes, quando nos demitimos de criticar, denunciar, chamar a atenção para o que está a acontecer na CS, só porque nos traz dissabores, estamos a ser cúmplices e a pactuar com a mentalidade de que a economia e o poder estão acima de todos os outros valores e de que informação é o mesmo que jornalismo, ou que ditadura e democracia são a mesma coisa.
Jornalismo não é só informação. O jornalismo implica ética e deontologia. Implica cumprir regras, verificar fontes, confrontar opiniões, fazer o contraditório, comprometer-se com a verdade, distinguir opinião de informação, ter tempo para pensar e investigar.
Só com um jornalismo de qualidade se consegue uma informação fidedigna e se obtém o valor do escrutínio independente das sociedades democráticas.
Que caminhos para um jornalismo livre e isento? Que financiamentos? São questões importantes e que urge pensar para desmascarar a construção de narrativas falsas e agendas mediáticas criadas para servir propósitos políticos e condicionamentos da opinião pública, ameaçando a democracia.
Espero que o 5º Congresso dos Jornalistas traga propostas concretas que ajudem a ultrapassar a atual situação.