Lembram-se daqueles tempos antes de existir a Internet, em que se acreditava que a estupidez das pessoas se devia à dificuldade de acesso à informação? Bem, estávamos enganados. A Internet trouxe um oceano de conhecimento ao alcance de um clique, mas, paradoxalmente, também se tornou um terreno fértil para a desinformação, a pseudociência e a generalização precipitada. Em vez de criar uma sociedade mais esclarecida, muitas vezes, parece que estamos navegando num mar de ignorância.
A ideia era simples: dar às pessoas acesso ilimitado à informação e, consequentemente, erradicar a ignorância. No entanto, não contávamos com a capacidade humana de distorcer e disseminar informações erradas. Hoje, qualquer pessoa com uma conexão à Internet pode se tornar um “especialista” em qualquer assunto, desde teorias da conspiração até curas milagrosas para doenças complexas. E aqui reside o perigo: a proliferação do erro e da falsa ciência.
Tomemos como exemplo a pseudociência. A Internet está repleta de “gurus” que defendem desde dietas milagrosas até teorias sobre a cura do cancro com sumo de beterraba. Estas ideias, por mais absurdas que sejam, encontram eco em milhões de pessoas que preferem acreditar em soluções simples para problemas complexos. Afinal, é muito mais reconfortante pensar que podemos curar uma doença grave com uma poção mágica do que aceitar a complexidade e a incerteza da ciência real.
E não podemos esquecer as teorias da conspiração. Desde a ideia de que a Terra é plana até a crença de que o homem nunca foi à Lua, a desinformação se espalha como um vírus. Esses mitos, alimentados por vídeos bem editados e discursos inflamados, criam uma visão distorcida da realidade e contribuem para um mundo mais instável e inseguro. Quando uma parte significativa da população acredita que cientistas e governos estão envolvidos em conspirações gigantescas, a confiança nas instituições decai, e o tecido social se fragmenta.
A mentira e a generalização também desempenham um papel crucial nesse cenário. As fake news, disseminadas por cliques e partilhas, criam uma realidade paralela onde os factos são irrelevantes. A velocidade com que uma mentira bem contada pode se espalhar supera em muito a capacidade da verdade em se estabelecer. E, na era da informação supersónica, a generalização simplista transforma questões complexas em slogans vazios, alimentando o rancor e o extremismo.
A consequência disso tudo? Um mundo mais polarizado, onde o diálogo se torna quase impossível. Em vez de debates construtivos, temos batalhas de gritos e ofensas nas redes sociais. As pessoas se refugiam em bolhas de pensamento onde apenas suas crenças são reforçadas, e qualquer opinião divergente é vista como uma ameaça. O resultado é uma sociedade rancorosa, onde o extremismo ganha terreno e a cooperação mútua se torna uma raridade.
Então, como podemos enfrentar este desafio colossal? Em primeiro lugar, a educação é fundamental. Precisamos ensinar as pessoas a pensar criticamente, a verificar fontes e a questionar informações antes de aceitá-las como verdadeiras. As plataformas de redes sociais também devem assumir a responsabilidade de combater a desinformação, implementando mecanismos mais eficazes para identificar e remover conteúdo falso. Além disso, é crucial promover a importância da ciência e do método científico. A ciência não é perfeita, mas é o melhor instrumento que temos para entender o mundo. Precisamos valorizar os especialistas e confiar em quem dedica a vida ao estudo e à pesquisa, em vez de confiar em qualquer pessoa com uma câmara e uma ligação à Internet.
O problema é que, em última análise, a responsabilidade é de cada um de nós. Devemos ser guardiões da verdade e promotores do diálogo construtivo, porque a verdadeira sabedoria não está em saber tudo, mas em saber distinguir o verdadeiro do falso e em estar disposto a aprender e a mudar de opinião com base em evidências. Algo que, percebemos agora, é um Everest a escalar.
Se conseguirmos isso, talvez possamos transformar a Internet de um campo de batalha de desinformação em uma verdadeira biblioteca do conhecimento humano. E, quem sabe, finalmente provar que não estávamos tão enganados assim sobre a inteligência coletiva da nossa espécie.