Nestes últimos tempos temos tido alguns exemplos de que a misoginia e a desigualdade entre mulheres e homens continua a ser estrutural, apesar da legislação e das políticas pela igualdade. Referirei três situações:
- no dia 19 de fevereiro o Público noticiou que a Inspeção-Geral da Administração Interna mandou expulsar um polícia por ter violado uma prisioneira. Tinha sido absolvido por dois tribunais. De acordo com o jornal, quatro juízas e um juiz não tiveram dúvidas em afirmar que a culpa foi da vítima e que o guarda teve um momento de fraqueza. Mais uma vez, o facto de um homem não ser educado para respeitar as mulheres ou para controlar os seus instintos mais básicos não causa qualquer estranheza a estes coletivos. A mulher acaba por ser sempre a culpada do que lhe acontece e, se é vítima de violência ou discriminação, de certeza que "estava mesmo a pedi-las!" Neste caso, para a IGAI não houve dúvidas. Escreveram no relatório que "foi um "tratamento claramente degradante", expulsando o polícia da carreira;
- Um canal de televisão optou por nunca tomar qualquer atitude perante os sinais de uma relação abusiva. Em nome do lucro, preferiram fechar os olhos ao que se foi assistindo, normalizando a violência e o ciúme como algo romântico, desculpabilizando o homem pelas suas atitudes. E assim viu-se uma mulher a ser controlada constantemente, a ser vítima de ciúmes, a ser isolada, ameaçada e culpabilizada pelas atitudes descontroladas do agressor. É forçada fisicamente a um beijo. No dia 13, ouvimos Cristina Ferreira defender que "só o amor pode resolver as coisas mais condenáveis". Quer enganar-nos. Isto não é amor. O amor respeita, não agride. Liberta, não isola. Potencia, não humilha. A TVI e Cristina Ferreira prestam um péssimo serviço ao país. A violência doméstica é dos crimes que mais matam e põe em risco as vidas das mulheres e das crianças dessas famílias. As feridas psicológicas deixam marcas para toda a vida;
- Na UE, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, foi ignorada por um ministro do Uganda que optou por não a cumprimentar, dirigindo-se unicamente aos dois homens que estavam no palco. Pela segunda vez, Charles Michel, vice-presidente do Conselho Europeu, achou normal tal atitude, mantendo-se impávido e sereno perante tal desrespeito. Só Macron, tentou corrigir o ministro, que mesmo assim não a cumprimentou. Como se mantém Charles Michel sem ser oficialmente chamado à atenção? Como não intervém o protocolo da UE neste tipo de situações? Mais uma vez, a normalização do desrespeito dirigido a mulheres é um facto que não causa estranheza ou reação a quase ninguém.
Quando se fazem piadas misóginas e depois se ouve "ele está só a brincar. Não pensa assim", isso é machismo puro. Não é humor.
Mulheres do mundo, do meu país, da minha região, da minha cidade, unamo-nos na nossa defesa! Somos mais de metade da população. Não nos calemos, perante a indiferença e a discriminação.
Nota - 4 de março, 18h, Baltazar Dias, Ana Cristina Pereira lança o livro "Mulheres da minha ilha, mulheres do meu país". Não percam!