Trata-se de uma "demissão silenciosa" (numa tradução livre) e em especial entre os trabalhadores mais jovens começa a difundir-se pelo resto do planeta. Pelo impacto que começa a ter é hoje uma das preocupações dos responsáveis pelas áreas de recursos humanos e chega aos políticos atentos dos variados setores.
Concretamente, não se trata de pedir a demissão da empresa onde se trabalha. Mas, de cumprir apenas o que está na "letra do contrato", seguindo à risca os horários e afastando qualquer vínculo emocional com a empresa. Apenas, para se ver a real dimensão deste problema, um estudo recente levado a cabo nos EUA revela que o problema afeta mais de 30% dos trabalhadores.
Perscrutando junto dos jovens trabalhadores, quais os motivos para este desligamento ou desinteresse, que os leva a "não vestir a camisola" da organização, encontramos uma panóplia de argumentos que se podem ligar ao facto de em muitas circunstâncias, em muitas realidades de trabalho, não existir um incentivo ao desenvolvimento de carreiras, não existir oportunidades de aprendizagem, não existir um contacto próximo das chefias, procurando saber como é que aquela pessoa se sente, como é que ela está, dizem.
Para já, entre nós, não existe estudo semelhante, que nos dê uma realidade concreta, mensurável, e apenas podemos avaliá-la pelo empirismo dos contatos que se vão fazendo junto dos trabalhadores jovens. O facto, é que não nos parecem muito longe da nossa realidade laboral aqueles sentimentos, nem quiçá a sua dimensão.
Os riscos na produtividade laboral e, depois, na "fuga" dos talentos é enorme.
Hoje, em Portugal, 1 em cada 6 dos jovens que procuram emprego tem dificuldade em encontrá-lo na sua área de formação e, sobretudo, dimensionado à sua habilitação académica. Mais, quando o encontram, 2 em cada 3 tem um contrato a termo. E, depois, 3 em cada 4 jovens têm um salário abaixo dos 950 euros. Ainda, a percentagem daqueles que trabalham mais de 40 horas duplicou nos últimos 10 anos. A verdade laboral junto dos mais jovens aponta, assim, inexoravelmente, para contratos cada vez mais precários, menos remunerados, e com mais horas de trabalho, realidade que inverteu e se agravou no pós-pandemia.
Para além de outros impactos, que esta "demissão silenciosa" acaba por condensar, inevitavelmente, aquele que se traduz no reflexo na produtividade das empresas será incontornável.
Ora, trazer à colação nesta "equação" a formação do nosso tecido empresarial é crucial. A este propósito, temos ainda um longo percurso a fazer e apesar dos impulsos, muito caminho há que arrepiar. Concretamente, nas nossas empresas, apenas um terço é administrada por gestores com formação superior qualificada (Retrato de Portugal na Europa, 2018, da PORDATA). Este número coloca-nos mesmo no topo da lista de países onde o empresariado têm menos formação e onde inclusivamente tem menor formação que os jovens trabalhadores Diz-nos o estudo que "é bem-sabido que o capital humano dos administradores, se medido como a proporção dos administradores com formação superior, está forte e positivamente correlacionado com os resultados de gestão. As equipas de gestão com, pelo menos, uns administradores com formação superior são mais produtivas".
Urge incutir nos nossos empregadores, portanto, a importância que tem investir nos seus trabalhadores fazendo-o de modo consciente, e com sentido, obtendo destes uma plenitude de confiança e capacidade de desenvolvimento de novos e melhores saberes.
Nunca é por demais renovar que o grande desafio, que se coloca a Portugal, é do crescimento, onde a competitividade acaba desempenhando um papel crucial e onde os mais qualificados são imprescindíveis.
Inverter, apostando em (re)motivar e evitar que se "demitam silenciosamente" os mais capazes e habilitados afigura-se, sempre, e cada vez mais, fundamental.
Eduardo Alves escreve à segunda-feira, de 4 em 4 semanas