O Presidente da República reiterou ainda, que há um risco evidente: "caso as instituições e os sistemas demorem eternidades a compreender que devem evoluir e reformar-se, reaproximar-se dos povos e desse modo não deixarem espaço para que outros preencham o vazio que vão deixando atrás de si".
Numa abordagem recente, na obra Uma Teoria da Democracia Complexa (2021), D. Innerarity, catedrático de Filosofia Política e Social, defende que as Democracias não estão hoje mais perante os desafios dos séculos XIX e XX, mas sim face aos desafios do século XXI. A violência, a corrupção ou a ineficiência de vários governos deixam de ser as únicas ameaças da Democracia. A grande ameaça, defende Innerarity é a "simplicidade dos conceitos políticos que tomámos de empréstimo, ignorando a complexidade crescente em que a nossa organização social se desenvolveu".
A Democracia deve ser vista, hoje, como um regime da complexidade. Encerra em si a discordância, protege a diversidade e a diferença. Desígnios que patrocinam a heterogeneidade, devendo-se então privilegiar, na gestão desta complexidade, o objetivo sublime de perceber que só assim esta não entra em anquilosamento, que leva à atrofia, ao definhamento e à sua autolimitação.
E. Morin, com 102 anos, e muito recentemente de visita a Lisboa, em setembro -Fundação Gulbenkian-, falou-nos sobre o estado do mundo. Sobre os regimes democráticos Morin propugna sobre a importância da reinvenção e defende um olhar crítico e atento destas realidades. Mais do que uma transformação, entende que uma metamorfose é relevante.
Ora, aquilo que os efeitos da pandemia associado à Covid -19, que assolou o planeta, trouxe às Democracias é que precisam realmente de se metamorfosear. Não só porque os efeitos pandémicos das desigualdades sociais e económicas, da precariedade laboral, da inflação, da guerra, da crise habitacional, etc., estão longe sequer de atenuados; como a estes se vão "aliar" as dimensões particularmente exponenciais de natureza ecológica e ambiental -que infelizmente pelos motivos de catástrofe vamos diariamente assistindo- e se agravarão, como vaticina de forma impiedosa o Secretário-geral da ONU, o português A. Guterres, quando afirma que: "acabou a era do aquecimento global e começou a da ebulição global" e de que tudo converge, hoje no planeta, para um "risco real de fragmentação".
Urge então introduzir mudanças. A quem nos governa mais do que discurso impõe-se ação e capacidade próprias, mas também próximas, de formação da vontade política de mudar.
Novas ideias, experiências, perspetivas e ações descentralizadas, perante as quais o "velho" sentido burocrático, muitas vezes central, já não se revela adequado e pode mesmo tornar-se inoperante. Envolver os cidadãos, chamá-los à vida quotidiana, trazer os melhores e mais capazes, fazê-los sentir, de novo, o valor do reconhecimento do mérito e da importância de participarem e estarem presentes nas soluções, para as quais a nossa vida cívica e comunitária é hoje inapelavelmente interpelada.