Parlamentar sou. De veia autárquica me confesso. Assim me sinto pelo menos desde 1997 quando, ainda imberbe, fui empossado secretário da Assembleia de Freguesia da Calheta.
É com esta sensibilidade, de proximidade à resolução dos problemas que cada cidadão experiência, que mais me identifico no devir da política diária. Sim, a política tem de responder às necessidades diárias das pessoas e contribuir para melhorar a qualidade de vida coletiva. Melhores condições físicas, melhores condições sociais, aumento de rendimentos e qualidade do serviço público prestado em todas as vertentes são, no essencial, as orientações que devem reger quem diariamente faz política.
Neste seguimento, e porque não se executam políticas sem orçamento, tantas vezes me surpreendo a refletir sobre os orçamentos dos municípios e freguesias deste país e destas regiões autónomas, cruzando-os com as competências de Câmaras e Juntas. Um exercício que tem tanto de surpreendente como de doloroso. Para um quadro de competências transversais e alargadas deparamo-nos com dotações orçamentais que roçam o ridículo no global do Orçamento de Estado. A título de exemplo, para as 11 câmaras da RAM em 2024 o Estado transfere pouco mais de 96 milhões de euros. Para os Açores, em 19 câmaras, são cerca de 148 milhões de euros. Já nem falo dos montantes para as Juntas, tão irrisórios que são. O poder local em Portugal é tratado com migalhas do Orçamento de Estado. Migalhas de euros para um rol abundante de competências. Migalhas de orçamentos para dar resposta a milhões de problemas que afetam diariamente as pessoas.
E neste quadro coabitam as associações de municípios e de freguesias, que representam 308 concelhos e 3091 juntas. É certo que a Lei de Financiamento das Autarquias Locais só pode ser alterada na Assembleia da República. Mas também é certo que 308 Presidentes de Câmara são mais que 230 Deputados, e que 3091 Presidentes de Junta são quase 13 vezes os 230 deputados. O poder democrático exerce-se pela legitimidade eleitoral. As eleições autárquicas são sempre as mais participadas. Presidentes de Câmaras e de Juntas são os mais legitimados para expressar a vontade dos cidadãos. São eleitos diretamente. E não tenho dúvidas que os cidadãos desejam mais orçamento para as suas freguesias e concelhos. É mais que tempo das associações nacionais e regionais de municípios e freguesias se unirem suprapartidariamente e porem fim a este atentado discriminatório que é a Lei de Financiamento das Autarquias. Não tenham dúvidas que juntos têm mais poder que os deputados da Assembleia da República. Unidos e coesos suprapartidariamente são mais fortes. Unir-se para, de quando em vez, abordar a causa animal ou a formação autárquica é curto e nada ambicioso. A ação conjunta, suportada em propostas de Lei fundamentadas nas competências legisladas, sem esquecer que nas ilhas o exercício dessas competências é ainda mais agravado pela distância ultraperiférica, tem de ser usada e exercida. Não por causa dos eleitos! Por causa dos eleitores e das suas regiões que mais fazem e necessitam. Haja visão, haja vontade!