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Artigo de Opinião

PALAVRAS APENAS

9/04/2024 08:00

Há cinquenta anos, Portugal abria-se a uma primavera que tardava. Trazia o futuro na ponta dos dedos e cravos vermelhos numa voz que escondia o medo no fundo do tempo e que cantava a liberdade. Acreditava-se (eu era uma menina, portanto falo de ouvir de dizer) que este “avril au Portugal” tinha valido a pena. E falava-se de liberdade como quem fala de uma manhã que acordava um país que tinha estado a dormir.

Nesse dia de prata (como lhe chamou Natália Correia), os (a)braços e as flores; a esperança de que mais nenhum dos rapazes das nossas casas fosse obrigado a ir para a guerra; a vontade de plantar risos nos canos das espingardas e de inaugurar um tempo em que todos tivessem o seu lugar, em que todos pudessem emitir a sua opinião, em todos tivessem as mesmas oportunidades de ser feliz.

Contam que esse foi um dia de festa, de uma luz de coisa nova que se acendia na vida de um povo que (agora sim!) podia lutar por si. Contam que o mundo inteiro se assombrou com a poética pacifica desta revolução. E Portugal foi grande, porque encontrou, na paz, o caminho da liberdade. Era a possibilidade de sermos livres (“uma gaivota, voava, voava”) que se transportava num andor feito de nunca mais: nunca mais a guerra, nunca mais o medo, numa mais a fome, nunca mais as desigualdades, nunca mais...

Passados tantos anos (uma vida! tanta vida!), recordamos o sonho deste abril. E perguntamos por ele, sempre que a nossa alma fica pesada de chão e não conseguimos abrir o coração para arejar. E lembramo-nos dos versos de Sophia de Mello Breyner e de quanto nos falta para que eles sejam verdade:

“Esta é a madrugada que eu esperava

O dia inicial inteiro e limpo

Onde emergimos da noite e do silêncio

E livres habitamos a substância do tempo”.

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