Na passada semana, necessitei de cuidados médicos e, como muitas vezes costumo dizer, só damos mesmo a importância e o devido valor à saúde quando ela nos faz falta.
Sendo pública, nessa altura, a informação relativa à sobrelotação do Hospital Dr. Nélio Mendonça e de que muitas pessoas aguardavam camas para internamento, recorri aos cuidados de saúde privados. Fi-lo porque, infelizmente, o recurso aos cuidados de saúde particulares deixou de ser um luxo e passou a ser uma necessidade ainda que nem sempre ao alcance de todos e precisamente por, conscientemente, saber que nem todos podem recorrer a esta solução, embora os meus descontos me confiram direito a usufruir do sistema público de saúde sem peso na consciência, preferi quase que dar a minha vez e reduzir o tempo de espera de muitos que não têm meios nem forma de recorrer a soluções alternativas.
A verdade é que ao chegar à unidade de saúde privada percebi claramente que a minha forma de pensar tinha sido comum à de tantas outras pessoas porque aquela unidade mostrava dar resposta, mas estar a ser alvo de grande procura.
Fui atendido. Conforme previa, a situação requeria algum cuidado e fiquei internado. Pensei nessa altura na quantidade de pessoas que, nas unidades de saúde públicas, estariam, na mesma situação ou até piores do que eu e ainda a aguardar serem atendidas. Pensei nos médicos, nos enfermeiros e nos auxiliares de ação médica e no esforço desumano que fazem para acudir, muitas vezes com parcos meios, a tanta procura.
Confesso que a minha revolta cresceu no dia seguinte quando a minha mãe precisou também ela de cuidados médicos e foi encaminhada da instituição onde se encontra para o Hospital Dr. Nélio Mendonça. Precisava de ficar internada e confirmei que as notícias veiculadas pelos meios de comunicação social eram de facto verdadeiras: poderia ter que ficar à espera de cama mais de 6 dias.
Porque os meus pais trabalharam a vida inteira e porque quem nos cria, mesmo quando já sem autonomia para decidir sobre o melhor para si, continua a merecer sempre o mesmo carinho e respeito, não hesitei e pedi que tratassem da transferência da minha mãe para a unidade de saúde onde me encontrava internado.
Enquanto aguardava junto à janela que a minha mãe desse entrada no serviço de urgência daquela unidade de saúde, deitei os olhos ao televisor, mais para me abstrair da situação que estava a vivenciar do que propriamente por estar atento ao programa que estava a ser transmitido e, coincidência das coincidências, falava-se das doenças da Saúde.
Ao princípio até pensei estar a ouvir mal porque o programa em causa, transmitido pela RTP-Madeira e no qual inclusivamente tive o gosto de já ter colaborado, na qualidade de comentador de arbitragem, deveria debruçar-se, tão somente, nas questões de âmbito desportivo, mas a minha indignação cresceu ao perceber que quem falava apontava apenas problemas ao estado da Saúde no “Continente”. Perante o cenário em que me encontrava, achei o comentário ofensivo, um completo atentado à inteligência de qualquer madeirense ou portossantense.
Então querem dizer que nós por cá estamos bem? Fecharam-se serviços de urgência em concelhos distantes do Funchal com o argumento de ser necessário concentrar e rentabilizar recursos humanos e materiais, percebemos que essa estratégia não está a resultar e ainda nos querem atirar areia aos olhos?
E se o estado da Saúde no “Continente” justifica, segundo o comentador, repensar na hora de votar, é coerente que não se peça que os madeirenses façam o mesmo? Em proporção, será que estamos mesmo muito melhor?
Continuei preso ao parapeito da janela, enquanto aguardava a chegada da minha mãe, pensando na fragilidade da condição humana. Não pude deixar de pensar nos filhos que não têm recursos e que têm que sujeitar os pais à situação de aguardar uma cama num corredor de um hospital e pensei nos pais que se confrontam com um problema de saúde de um filho e que podem não ter recursos para o tratar como necessitaria.
Deixo uma palavra de apreço ao trabalho heroico dos profissionais da área da Saúde, pois são eles que, com muito esforço e dedicação, dão o corpo às balas enquanto alguns querem a todo o custo fazer passar a ideia que por cá está tudo bem. Como diria uma deputada à Assembleia da República que ficou muito conhecida (nem sempre pelas melhores razões): É MENTIRA!!