Temos sede de luz. E de liberdade. E de deixar que a esperança tome conta dos nossos passos. Temos saudades de não ter medo e nos deixarmos ir nas manhãs no mundo. Porque elas não voltam para trás. Porque a vida não volta para trás. Porque, quando nos damos conta, os anos passaram, já perdemos tantas coisas…
Temos sede de manhãs e de princípios, com tudo o que eles trazem de desafio e de esperança e de vontade. Temos sede da água que nos conduz ao mar. Sede de nós. E dos outros. E de Deus.
Temos sede de coragem, da força de dizer que não, que não aceitamos as guerras que rebentam ao nosso lado (as que moram longe, sim, é mais fácil), que não aceitamos a mentira (também as nossas mentiras), que não queremos que ninguém passe dificuldades, que não, portanto.
As sedes levam-nos a descobrir o caminho da paz, da felicidade que se constrói por dentro. As sedes ajudam-nos a procurar o que torna os dias sólidos, a liberdade de sermos quem somos. As sedes apontam-nos a água. E, a mim, sempre me encantou a liberdade da água. Vai por onde quer, ora branda, ora forte, procura os seus próprios caminhos e desce sempre, em direção ao infinito que é o mar. Livre, sempre livre. Tão diferente de nós, constantemente presos a coisas que não valem a pena, a gente que não vale a pena, a matérias que nos impedem de seguir a nossa vida.
Talvez, por isso, hoje, me apetece fechar os olhos e pedir com D. Tolentino: "Ensina-me, Senhor, a rezar a minha sede"1
1 Mendonça, José Tolentino, Elogio da Sede, 2018.