Os ataques do exército israelita e o bloqueio ilegal contra Gaza infligiram um sofrimento profundo a crianças com deficiência, e as armas explosivas deixaram muitas outras pessoas com deficiências permanentes, indica hoje um relatório da Human Rights Watch (HRW).
O cerco em curso em Gaza, refere a organização de defesa e promoção dos direitos humanos, com sede em Nova Iorque, “já causou danos desproporcionais às crianças com deficiência”, que já enfrentavam uma situação precária, e correm um risco particular de sofrer danos psicológicos duradouros.
Nesse sentido, a HRW defende que os países devem suspender as transferências de armas enquanto as forças israelitas cometerem violações graves das leis da guerra com impunidade, incluindo restrições ilegais à ajuda e ataques a hospitais.
“O uso extensivo de armas explosivas pelos militares israelitas causou ferimentos graves, resultando em incapacidades permanentes e cicatrizes permanentes nas crianças de Gaza”, sustenta a HRW no relatório, de 85 páginas.
Intitulado “’They Destroyed What Was Inside Us’: Children with Disabilities Amid Israel’s Attacks on Gaza” (“Eles destruíram o que havia dentro de nós: Crianças com deficiência no meio dos ataques de Israel a Gaza”), o relatório documenta que as crianças que adquiriram uma deficiência e as que já as tinham em Gaza (cerca de 98.000, segundo a UNICEF) “enfrentam uma situação de segurança precária”.
A situação agrava-se, refere a HRW, à medida que as populações lutam para cumprir as frequentes ordens de retirada do exército israelita e a falta de um aviso prévio eficaz sobre ataques.
“O cerco em curso a Gaza, a obstrução ilegal da ajuda humanitária, o uso da fome como arma de guerra e os danos e a destruição de hospitais causam danos desproporcionais às crianças com deficiência, que lutam para ter acesso a tratamentos e suprimentos médicos desesperadamente necessários, bem como a dispositivos de assistência, comida e água”, adverte a organização.
“Os ataques ilegais e a negação de ajuda por parte dos militares israelitas estão a prejudicar e a traumatizar os palestinianos em toda Gaza, mas as crianças com deficiência enfrentam ameaças crescentes às suas vidas e segurança”, afirmou Emina Cerimovic, diretora associada de direitos das pessoas com deficiência da HRW.
Por outro lado, a utilização de explosivos pelos militares israelitas em áreas densamente povoadas “aumenta o risco de ataques ilegalmente indiscriminados”, frisa a HRW, que dá conta de que familiares e profissionais médicos relatam que os ataques israelitas danificaram casas, escolas, hospitais e centros comerciais, sem aviso prévio, causando mortes, ferimentos graves e incapacidades permanentes em crianças.
Para o relatório, a HRW entrevistou 20 familiares de crianças com deficiência, uma criança com deficiência e 13 trabalhadores médicos e humanitários, tendo também analisado registos médicos de várias crianças com deficiência e mais de 50 vídeos e fotografias que mostram as consequências dos ataques documentados no documento.
Por seu lado, lembra a HRW, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) informou que milhares de crianças em Gaza adquiriram deficiências devido a ferimentos causados por armas explosivas desde 07 de outubro de 2023.
O bloqueio do governo israelita a Gaza, as restrições à ajuda humanitária, incluindo medicamentos e fornecimentos médicos, e as severas restrições sobre quem pode sair de Gaza para tratamento são especialmente prejudiciais para as crianças, incluindo as com deficiência, prossegue a organização.
“Crianças feridas com necessidade urgente de atenção médica imediata suportaram tempos de espera excessivamente longos e foram submetidas a cirurgias sem anestesia, aumentando o trauma. As crianças que necessitam de cuidados médicos contínuos ficaram sem acesso regular a eles durante quase um ano. As que necessitam de uma dieta específica correm um risco particularmente elevado de desnutrição e fome”, observa a HRW.
Em setembro, o Ministério da Saúde de Gaza informou que mais de 41.500 palestinianos, incluindo mais de 16.750 crianças, foram mortos desde 07 de outubro.
“Tanto o direito internacional humanitário como o direito internacional dos direitos humanos preveem a proteção das pessoas com deficiência, incluindo as crianças, durante conflitos armados. A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada por Israel em 2012, obriga os Estados Partes a tomar ‘todas as medidas necessárias’, de acordo com o direito humanitário internacional e o direito internacional dos direitos humanos, para garantir a proteção e segurança das pessoas com deficiência em situações de conflito armado”, nota a HRW.
“O fracasso dos militares israelitas em fornecer procedimentos de retirada adaptáveis para crianças com deficiência viola os seus direitos ao abrigo da convenção e aumenta a probabilidade de ferimentos adicionais ou mesmo de morte”, conclui a HRW.
Segundo a organização, os Estados Unidos, a Alemanha e outros países que continuam a fornecer armas e assistência militar a Israel “correm o risco de cumplicidade em crimes de guerra e graves violações dos direitos humanos”.
“As autoridades israelitas precisam de tomar medidas imediatas para acabar com as mortes injustas, os ferimentos e o sofrimento das crianças, especialmente das que têm deficiência”, disse Cerimovic.
“Os governos devem aprovar urgentemente medidas para pressionar o governo israelita a cumprir as suas obrigações legais para evitar novas atrocidades e garantir que os direitos das crianças com deficiência, e de todos os outros, sejam respeitados”, termina a HRW.