O tribunal recusou hoje o pedido da defesa de Ricardo Salgado para o ex-banqueiro ser dispensado de comparecer no julgamento do processo BES/GES, cujo início está marcado para 15 de outubro no Campus da Justiça, em Lisboa.
“O Tribunal considera curial tomar contacto com todos os arguidos e, bem assim, com o arguido Ricardo Salgado, designadamente para efeitos de proceder à sua identificação e de conhecer a sua vontade”, refere o despacho assinado pela juíza Helena Susano, na sequência do requerimento da defesa do antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES), que alertou para a evolução desfavorável da doença de Alzheimer que lhe foi diagnosticada.
No requerimento apresentado em tribunal e que foi conhecido na terça-feira, a defesa citou o relatório mais recente do médico que acompanha o antigo banqueiro, com data de 27 de setembro, sublinhando que Ricardo Salgado “não apresenta capacidade cognitiva para participar de forma competente em qualquer sessão judicial e que a simples presença física num ambiente de tribunal pode gerar um agravamento dos sintomas da doença”.
O documento do Juízo Central Criminal de Lisboa, a que a Lusa teve acesso, sublinhou ainda que a informação clínica sobre o antigo presidente do BES enviada pelos advogados Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squillace indica que Salgado apenas não terá “capacidade para responder de forma informada e competente a questões de alguma complexidade ou que exijam precisão e rigor nas respostas”, sendo viável a sua presença para a identificação.
“Não se vendo como não possa, apesar do retrato traçado pelos seus defensores, exteriorizar a sua vontade (...) e, muito menos, responder a questões quanto à sua identificação, sendo admitido, a todo o tempo, o acompanhamento por familiar, indefere-se, em face do exposto, o requerido pelo arguido Ricardo Espírito Santo Silva Salgado”, refere o despacho.
Contactado pela Lusa para reagir a esta decisão do tribunal, o advogado Francisco Proença de Carvalho não quis fazer comentários.
A defesa do ex-banqueiro tinha destacado no requerimento submetido ao tribunal a “perda de autonomia global” de Ricardo Salgado e referiu que o principal arguido do processo BES/GES (também designado como Universo Espírito Santo) precisa da “supervisão de um cuidador” para a maior parte das atividades do dia-a-dia, na maioria das vezes asseguradas pela mulher.
Segundo o requerimento, a anterior participação de Ricardo Salgado numa sessão judicial, em fevereiro deste ano, “resultou num claro agravamento dos sintomas cognitivos e comportamentais”, pelo que a defesa pediu a sua dispensa de comparecer em audiência de julgamento, argumentando que essa obrigação vai “contra a mais elementar dignidade humana e atenta contra os mais básicos princípios de respeito pela vida humana”.
De acordo com a defesa, o atual estádio da doença de Alzheimer impede o ex-banqueiro de exercer o direito de se defender das acusações imputadas pelo Ministério Público (MP).
O julgamento do também denominado processo Universo Espírito Santo vai arrancar mais de uma década após o colapso do Grupo Espírito Santo (GES), em agosto de 2014, e tem Ricardo Salgado como principal arguido.
O ex-banqueiro foi acusado de 65 crimes, entre os quais associação criminosa, corrupção ativa, falsificação de documento, burla qualificada e branqueamento, mas três crimes prescreveram entretanto, pelo que vai responder em julgamento por 62 crimes.
Considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, este caso agrega no processo principal 242 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro. Segundo o MP, a derrocada do GES terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.