MADEIRA Meteorologia

Artigo de Opinião

Engenheiro

1/02/2024 08:00

Quarta-feira, dia 24 de janeiro de 2024, ficará na história como uma verdadeira aluvião na política madeirense, o dia em que o partido que construiu a Madeira de hoje sofreu o seu mais pesado revés. Foi um golpe seco e inesperado, e não veio de um qualquer partido do espectro da oposição, sempre atarantada e repleta de frustrações. Veio como uma aluvião, sob a forma de uma operação de investigação criminal, suportada por um sem número de meios, alguns aéreos, outros terrestres e outros ainda, de comunicação. Estes últimos, do continente e avisados previamente e com as sempre úteis indicações das horas e dos locais mais apetecíveis e porventura mediáticos.

Numa assentada e com meia dúzia de fugas de informação estrategicamente plantadas em certa comunicação social estava ganho o dia. Acto contínuo, três suspeitos, que num dia apenas foram detidos, acusados e levados a julgamento com sentença transitada em julgado. Na avidez do processo mediático e do conveniente julgamento popular e sumário, até peças dos actos jurisdicionais do inquérito foram divulgadas. Onde está a presunção de inocência? Um princípio fundamental do direito penal português. O suspeito ou o arguido tem um vasto leque de direitos, entre eles o direito de ser informado dos factos que lhe são imputados antes de prestar declarações, mas não certamente através das televisões ou dos jornais.

Como é evidente e não devemos ser ingénuos, este processo deixou uma ferida aberta no PSD, o dano está causado e vão ser precisos muitos anos até que se faça justiça aos visados. As aluviões têm este condão, quando passam deixam um rasto de destruição. Mas também e como bem sabem os madeirenses, depois das grandes catástrofes há que arregaçar as mangas e por mãos à obra, não podemos parar nem ficar calados perante a adversidade. Existe uma maioria parlamentar na Madeira, é uma maioria estável formada por diversos partidos e que resultou há muito pouco tempo da vontade expressa dos madeirenses. O nosso sistema é um sistema iminentemente parlamentar e não semipresidencialista. É a Assembleia Legislativa da Madeira que dá posse ao Governo não é o Presidente da República.

Logo após as primeiras noticias não faltaram os doutos comentadores do continente a mandar palpites e a querer impor condições à Madeira. Fazer comparações entre as duas ocorrências políticas mais recentes não se afigura correcto, elevar a estabilidade orçamental a um grau de dogma não é intelectualmente honesto, o que é preciso é estabilidade política. Posso ter um orçamento aprovado, mas se não tiver um quadro político estável e robusto, o orçamento não passa de um mero ornamento. Um Governo novo, com um novo Presidente, terá a confiança da maioria parlamentar que suportava o anterior Governo, isto é certo e já o foi afirmado pelos diversos intervenientes. Este Governo está já constitucionalmente em gestão, há que nomear um novo, e quanto mais cedo melhor. Para o efeito podendo ainda aproveitar parte do elenco governativo actual. Ficar meses com um Governo diminuído apenas para aprovar um orçamento e à espera de umas eleições será penoso para o PSD e desastroso para a Madeira. As eleições a ocorrer no curto prazo vão contribuir para um cenário de instabilidade, abrindo o provável cenário de uma série de actos eleitorais sequenciais e ineficazes e que vão castigar a Madeira e os Madeirenses durante anos, sem soluções governativas estáveis e credíveis.

Para que não fique uma ideia errada, tenho para mim que a justiça tem de actuar, a justiça pode e deve utilizar todo os meios e as ferramentas à sua disposição (claro que com a devida proporcionalidade) para que a lei se faça cumprir e para que o estado de direito e as instituições públicas prevaleçam. A causa e a coisa pública têm de ser defendida com firmeza, mas nunca esmagando os mais básicos direitos de cidadania. Não se trata apenas da relação do cidadão com o Estado, trata-se também das obrigações que o Estado tem para com o cidadão. Mal comparando e com as devidas distâncias, o espetáculo aeroportuário da semana passada e até pelo tipo de aviões utilizados fez-me lembrar o triste transporte de prisioneiros afegãos e iraquianos para a base de Guantánamo. Em 2002 foram afegãos chamados Abdullah ou Mohammed, em 2024 foi o Pedro, um cidadão português que ia no avião e é meu amigo.

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