Ouvi, repetidamente, relatos desses dias pela boca da minha mãe que recordando com entusiasmo tempos prenhes de infância, me contou dos quartos com beliches onde adormeciam embalados pelo marulhar das ondas, do salão refeitório e do pão com marmelada, um pitéu de estalar os dedos para a época. Apelando à memória, que já dá evidentes sinais de preguiça, assegura que deviam ir cerca de 100 crianças, que eram divididas em grupos, de acordo com a idade. Certo dia, uma foto colocada a circular nas redes sociais, também ela sacrificada impiedosamente pela sucessão dos instantes, onde um grupo de crianças de chapéus de palha, sentado nas pedras do calhau, observava um outro grupo, em fatos de banho rudimentares e costurados pelas freiras, na babujinha e à volta de um homem em tronco nu, a faz acrescentar, quase de um fôlego:
- É ele! É ele mesmo!
- Ele quem? - perguntei, tentando focar o olhar à procura de um reconhecimento…
- O safado do banheiro! Ele agarrava-nos e metia-nos dentro de água, cabeça e tudo. Um a um, estás a ver?
Não foi difícil imaginar a cena. Aliás, acho que qualquer um de nós consegue visualizá-la, sem qualquer esforço. Ainda há quem submeta os mais temerários, a experiências supostamente radicais.
E, passados uns minutos, dando mostras de algum apaziguamento, rematou:
- Havia uma tenda. Era lá que mudávamos de roupa. Íamos em grupo. E havia uma canção... sim... uma canção que se cantava dentro do autocarro, ali, quando se fazia a curva e se avistava a baía… o refrão era assim:
"e com alegria e satisfação
vamos a Machico passar o verão
passar o verão numa casa à beira mar
aragem que passa e espuma branca nos vem embalar"
Deixei-a na cozinha, a trautear o refrão enquanto arrumava a loiça na máquina e ao fechar a porta do quintal dei-me conta de que nunca fui a uma colónia de férias. Ainda irei a tempo?