"O que fazer quando uma pessoa fala e não se cala?" Nos vários cursos e palestras que faço sobre comunicação e relacionamento interpessoal no trabalho esta é a pergunta mais recorrente.
Falar sem medida numa reunião de trabalho, de condomínio, numa discussão, ou numa apresentação promove o desespero de quem ouve, cria resistência sobre o que está a ser dito. O pior: fica quase tudo por resolver, pois o que deveria ser o foco deixou de o ser. Com isso, as pessoas deixam de querer aparecer porque consideram que a sua presença não terá qualquer contributo e será uma perda de tempo. E tempo é o recurso mais precioso que temos. Falamos muito por acreditarmos que quanto mais falarmos mais as pessoas vão concordar connosco. Pode acontecer e será porque os outros foram vencidos pelo cansaço (por favor, cala-te!).
Qualquer ser humano tem a necessidade de se sentir apreciado e isso passa por ser ouvido. Andamos todos desconfiados uns dos outros e estamos feitas umas panelas de pressão sempre com palavras impetuosas e barulhentas.
O que eu tenho são os "meus sacos de pancada". Aquelas três pessoas que basta mandar mensagem com "podes falar?". Quando isso acontece aquele tempo é sagrado e é para ouvir. Só damos opinião quando perguntado por quem está a desabafar. Não menosprezamos o que está a ser dito, nem metemos veneno. Apenas ouvimos.
Estas amizades constroem-se. Apesar de sabermos que "estamos sempre aqui", respeitamos o tempo do outro. O desabafo é um meio de auto-organização. É chato estar a ouvir constantemente o mesmo e do outro lado não ver qualquer atitude de mudança. O mais importante: há um pedido. As pessoas têm uma paranoia em pedir ajuda e mostrar a sua fragilidade, depois fazem figuras e ninguém tem paciência para as ouvir.
De facto, não precisas de ser ouvido e compreendido por todos. Escolhe as tuas pessoas. Se não tens, aconselho que saias da toca e procura relacionar-te em outros contextos. Se achas que não dá para já, escreve (mas não é aquelas desgraças que vemos nas redes sociais). Escreve para ti. A escrita é a melhor forma de se expressar e sem que nos interrompam o raciocínio. Liberta esses pensamentos e no momento certo fala de forma estruturada, ponderada, pragmática, dando espaço aos outros para darem a sua opinião e contributo.
O que faço quando alguém fala pelos cotovelos em momentos inapropriados? Vou resumindo o que está a dizer e peço para me confirmar se eu percebi bem. Faço por não interromper e aproveito as suas respirações. Assim que eu me aperceba que já terminou o raciocínio, agradeço e utilizo algo que disse para relacionar com o tema que é preciso falar. Também funciona reconhecer a importância do assunto e peço para agendar dia e hora e assim dar a devida atenção. Outro aspeto que resulta bem em reuniões é o cronómetro.
Como seriam as relações se houvesse capacidade de ouvir e dizer "Eu no teu lugar teria sentido o mesmo"? Como seriam as reuniões se nos concentrássemos no que deve ser decidido e "lavássemos roupa suja" antes ou depois?
Como seria se houvesse a capacidade de respeitar a informação que me foi dada em jeito de desabafo, evitando fazer intrigas ou gozar disso com outras pessoas, ou jogar à cara num momento de maior vulnerabilidade?
É importante o poder da oratória, mas mais importante é a arte respeitosa da "escutatória".