Num momento em que os Restos Mortais do Bispo Senhor D. Francisco Santana foram justissimamente transladados para a Sé do Funchal, é Dever revisitar a Memória de Quem foi o grande Líder da Revolução Tranquila da Madeira. Síntese conforme espaço jornalístico*
Toma posse da Diocese a 12 de Maio de 1974. Homem de CONVICÇÕES sociais e democráticas fortíssimas, com experiência de apostolado nos meios Operários e de Juventude. Na linha da Encíclica “Mater et Magistra” defendia o DEVER DE INTERVENÇÃO da Igreja na defesa da Prioridade da Pessoa Humana e na concretização do Bem Comum.
Queria uma Igreja sem medo do mundo e lutadora. Não uma Igreja de “funcionários de Deus” em catacumbas confortáveis.
A par, um humor forte, crítico, educado e sempre a propósito. Sobretudo de uma grande entrega e humanismo nas suas Amizades.
No Verão de 1974, tinha eu 31 anos, depois de ler algo meu e ouvir vários Leigos, D. Francisco chama-me ao Paço Episcopal e nomeia-me Director do “Jornal da Madeira”, com quatro objectivos: 1. Defender um regime democrático para Portugal. 2. Defender uma Autonomia Política para a Madeira. 3. Defender uma nova ordem económico-social para o Povo Madeirense, uma Justiça Social que acabe com o que de injusto e inculto no passado. 4. Não fazer do “Jornal da Madeira”, uma folha paroquial, mas um DIÁRIO DE INTERVENÇÃO.
Para tal sugeriu-me um editorial diário durante os 3 anos e meio que aí estive, a “Tribuna Livre”.
Foi das Pessoas que mais contribuiu para a minha Formação e mais me ajudou na carreira pública.
No ambiente de combate político da época, a liderança contra D. Francisco e contra a Democracia vinha de um grupo, hoje ex-padres, que seguiram o marxo-fascismo do movimento internacional “cristãos para o socialismo”. Grupo, ao qual todos os partidos políticos da área marxista, cá, subordinavam a sua estratégia, porque já então eram falhos de Quadros e de lideranças.
Este grupo movimentou a ocupação do Seminário da Encarnação, onde D. Francisco esteve sequestrado. E, na mesma noite, a “tropa” ocupou o “Jornal da Madeira”, donde saiu a tempo de ser evitado um “banho de sangue”, pois eles nem sabiam pegar na G3, mas os Tipógrafos e o restante Pessoal sabiam manusear as barras de chumbo, destinadas, à época, às impressoras.
D. Francisco contrapõe com sucessivas mobilizações de massas em todo o Arquipélago, sendo mais impressionantes as do Corpo de Deus, nos Barreiros, que depois, com dezenas de milhares de pessoas, descia a pé sobre o Funchal, com Bênção final no adro da Sé.
Na Educação, combate à investida totalitária do marxo-fascismo, criando os Jovens Cristãos da Madeira, que se batem muito bem e não apenas nas Escolas. Pertenceram-Lhes muitos dos hoje melhores Quadros da Madeira. Está na fundação da APEL e da política pioneira, praticada pelos Governos Regionais, de tratamento igualitário entre ensino público e privado.
Perguntava-me sempre com seguia a Educação Cívica através dos comícios partidários, chegando-me a dizer que, na situação em que se vivia, primeiro o esclarecimento do Povo, mesmo que, por esta razão, não pudesse ir à Missa.
Em vez de um “partido cristão”, queria os CRISTÃOS NOS PARTIDOS. O mesmo defendia para a organização e intervenção sindical, pedindo a presença dos Cristãos nos Sindicatos.
Teve influência decisiva no pioneirismo do modelo de concertação social única em que se vive na Madeira, pois a Região adoptou um sistema tripartido - ao contrário do Continente - na negociação dos contratos laborais (Governo Regional também parte).
Foi D. Francisco também decisivo na criação legal da Bandeira da Região Autónoma da Madeira, querendo um símbolo cristão Nesta, daí a Cruz da Ordem de Cristo que tutelou o Arquipélago até D. Manuel I.
O seu Pensamento está no modelo da justa e pacífica extinção do regime da Colonia. Hoje, a única Reforma Agrária de sucesso em Portugal.
Até no Protocolo da Região Autónoma - que está em vigor, pois o respectivo Decreto nunca foi revogado, mas agora, em decúbito dorsal, aplicam o de Lisboa!... Nele dá-se o lugar adequado às Instituições que fizeram Portugal: Igreja, Forças Armadas, Universidade e Tribunais.
Face ao resultado das primeiras eleições livres, logo D. Francisco passa a manter sempre a exigência de MAIS AUTONOMIA!
Quando do desastre do avião da TAP, nas Exéquias, desafia Lisboa “a deixar de brincar com o Povo português e, no caso, com o Povo Madeirense”, dado o Estado central não resolver o problema aeroportuário.
Na questão da “Flama” entendia que o movimento devia ser anti-totalitarismo, não usar meios violentos e exigir uma Autonomia lata, mas contra o separatismo.
Posto ante o problema conjugal do Dr. Francisco Sá Carneiro, limitou-se a dizer: “Quem somos nós, para julgar o Dr. Sá Carneiro?” E manteve sempre relações institucionais e pessoais normais com o Primeiro-Ministro.
Quando havia ameaças de invasão ou de ataques ao “Jornal da Madeira” pelos marxo-fascistas, D. Francisco juntava-se a nós e convivíamos com os apoios que, em profusão nos chegavam do Povo.
Até Pescadores com facões de peixe, ali estiveram connosco.
Quando das tentativas de agressão, de que foi alvo em Machico, o Parlamento da Madeira, em nome do Povo Madeirense, expressou-Lhe toda a Solidariedade.
Sem perder a Sua “força da Natureza”, só uma vez o vi muito, mas mesmo muito preocupado. Quando dos acontecimentos a favor dos comunistas, 11 de Março 1975. Chegou a planear o que fazer na Madeira, se Portugal se tornasse igual a uma Polónia ocupada pelo imperialismo comunista, onde se esboçava algumas concessões à Igreja.
Situação “incómoda” para mim, foi quando Lhe comuniquei que tinha de avançar para o Governo Regional. D. Francisco, entendia que ainda não.
Uma “Directiva” que recebi do Senhor D. Francisco, já presidente do Governo Regional, foi quando da eleição do Papa S. João Paulo II. À hora do almoço, telefona-me para casa e pergunta-me: “Dr. Alberto João (curioso que era o nome com que Ele e Sá Carneiro me tratavam), já refletiu no que representa para a Europa e para o Mundo a eleição deste Papa polaco?...”. Lá disse o que eu pensava. Resposta de D. Francisco: “- Então faça o favor de escrever isso!”, e desligou.
Partiu, após doença prolongada, nas primeiras semanas de Março 1982, deixando estas Palavras, entre Outras, ao Povo Madeirense: “Nasci e vivi pobre; pobre quero morrer”.
O Parlamento da Madeira atribuíu-Lhe, a título póstumo, a maior Condecoração da Região Autónoma e o Governo Regional homenageia-O com o Seu Busto na praça a que deu o Seu Nome.
E, achem estranho, ou não achem, às vezes, em circunstâncias difíceis, viro-me para a Sua Presença Espiritual, procurando descortinar como D. Francisco me aconselharia. Nunca me dei mal...
*Para mais desenvolvimento, “Relatório de Combate”, Publicações D. Quixote, Abril 2017, paginas 30 e 216.